A possibilidade de crédito de PIS/COFINS quanto à exaustão de recursos florestais. O equívoco do ADI SRF 35/2011

O tema do presente artigo vem despertando significativa polêmica em virtude de diversas Soluções de Consulta emitidas pela Secretaria da Receita Federal onde se nega o direito ao crédito de PIS/COFINS quanto ao chamado encargo de exaustão, sob alegação de ausência de previsão legal.

Bem por isso, recentemente a Secretaria da Receita Federal editou o Ato Declaratório Interpretativo n. 35, de 02 de fevereiro, de 2011, onde enuncia: “Às pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) é vedado descontar créditos calculados em relação aos encargos de exaustão suportados, por falta de amparo legal.”.

O entendimento no sentido da vedação é de evidente equívoco ao se realizar uma adequada interpretação do sistema jurídico pelo método sistemático e finalístico, desde a Constituição até as legislações envolvidas.

A exaustão nada mais significa que um encargo ou custo decorrente da diminuição do valor de recursos minerais ou florestais em virtude de sua exploração (arts. 59, 183, Lei n. 6.404/76), que servirá como critério de avaliação do ativo (art. 183 LSA), pautando-se pelos princípios de depreciação.

Por sua vez, o Regulamento do Imposto sobre a Renda, ao tratar da tributação de pessoas jurídicas, permite que se compute como custo ou encargo, em cada período de apuração, a importância correspondente à diminuição do valor de recursos florestais (art. 334), cujo valor da cota de exaustão será apurada da seguinte forma: (i) – terá como base de cálculo o valor das florestas; (ii) – apurar-se-á, inicialmente, o percentual que o volume dos recursos florestais utilizados ou a quantidade de árvores extraídas durante o período de apuração representa em relação ao volume ou à quantidade de árvores que no início do período de apuração compunham a floresta; (iii) -o percentual encontrado será aplicado sobre o valor contábil da floresta, registrado no ativo, e o resultado será considerado como custo dos recursos florestais extraídos.

Por outro lado, surgiu nos anos de 2002 e 2003 o chamado PIS/COFINS não-cumulativo, nos moldes, do art. 195, § 12, da Constituição Federal, bem como Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003. Por este regime, buscou-se introduzir no sistema tributário uma forma de se mitigar a tributação sobre a receita.

Por meio desta legislação consagrou-se a não-cumulatividade para o PIS/COFINS, adotando-se a sistemática do método subtrativo indireto, ou seja, base sobre base, embora com alterações. Este regime, portanto, permite a apuração de créditos a serem calculados sobre a base na aquisição de bens e serviços, os quais serão abatidos da base de apuração do PIS/COFINS, cuja incidência é sobre a receita.

Neste ponto, revela-se outro aspecto importante, a não-cumulatividade do PIS/COFINS está vinculada à noção de receita, não se confundindo com aquela aplicada para ICMS e IPI, embora com pontos comuns.

A mais disso, com a introdução do art 195, § 12, da Constituição Federal, com a noção de não-cumulatividade, a liberdade do legislador sobre a matéria ficou mais estreita, além de ser fundamental relevância uma interpretação que se compatibilize com aquela.

Diante de tais aspectos, é possível afirmar que o Ato Declaratório Interpretativo da SRF n. 35/2011 não é procedente. Isto porque, entendemos pela viabilidade do crédito quanto à exaustão de florestas.

Ora, o art. 3º, inciso VI, expressamente, reconhece o direito ao crédito de bens incorporados ao ativo para utilização na produção de bens destinados à venda, o que se aplica exploração dos recursos florestais, uma vez que estes direitos estão vinculados ao ativo e ao processo produtivo dos bens destinados à venda. Até este ponto, não pode existir dúvida quanto à existência do crédito.

A razão para a negativa pela Receita Federal está no art. 3º, § 1º, inciso, III, da Lei n. 10.833/2003, pois, ao tratar da forma de cálculo do crédito (e não da sua existência), somente explicita que este será apurado sobre o valor dos encargos de depreciação e amortização, não incluindo explicitamente a exaustão.

Sem embargo disso, entendemos que não há impedimento ao crédito, pois: (i) – o art. 3º, inciso VI, prevê o crédito; (ii) – o art. 3º, § 1º, III, ao não enunciar exaustão, não torna o crédito inexistente, já que somente trata da forma de apuração deste; (iii) – no caso da exaustão, como o custo ou encargo correspondente à diminuição do valor de recursos florestais segue os princípios da depreciação (art. 59, § 1º, LSA), há plena previsão para a apuração do crédito, mesmo que considere esta alternativa o emprego da analogia; (iv) – trata-se de um custo ou despesa ligado à produção, de maneira que pela noção constitucional de não-cumulatividade não pode ser restringido, muito menos sem que exista lei neste sentido; (v) – não há restrição expressa ao crédito em lei; (vi) – a IN SRF n. 457/2004, que regulamenta os encargos de depreciação, em seu art. 1º, § 3º, somente veda a utilização de créditos sobre encargos de depreciação acelerada incentivada ou na hipótese de bens usados, nada dispondo quanto à exaustão; (vii) – a interpretação dada pela Receita Federal desconsidera a relevância e essência do instituto da exaustão, que se assemelha à amortização ou depreciação.

De outra parte, caso não tipifique tal custo (exaustão) o permissivo do art. 3º, inciso VI, é possível o crédito a partir do entendimento de que se trataria de um insumo, nos moldes do inciso II, uma vez que se cuida de um custo sofrido pelo contribuinte que contribui de forma direta e relevante no exercício de sua atividade (produção) visando à obtenção de receita. Neste ponto, convém ainda lembrar recente Solução de Consulta da SRF n. 36, de 10 de janeiro de 2011, onde se permite crédito de PIS/COFINS quanto “às despesas com exaustão de florestas utilizadas como insumo na fabricação de bens destinados à venda (celulose, papelão, etc)”.

Por fim, hipoteticamente, caso não se entenda neste sentido, acreditamos ainda que a restrição fere a noção constitucional de não-cumulatividade, além de violar o princípio da igualdade, a capacidade contributiva e a vedação do confisco, pois restringe um crédito específico daqueles que exercem atividade econômica vinculada à exploração de florestas e que representa um custo significativo.

Em tais condições, outro entendimento não resta senão a plena permissão constitucional e legal para o crédito de exaustão de florestas às pessoas jurídicas submetidas ao regime não-cumulativo de PIS/COFINS, sendo ilegal e inconstitucional o ADI SRF 32/2011, ao restringir indevidamente este direito.

Por Fábio Pallaretti Calcini

Fonte: FISCOSoft

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