BDO pede ao Cade medida urgente para setor

Por Juliano Basile | De Brasília

A diretoria britânica da BDO esteve pessoalmente no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) do Ministério da Justiça para tentar convencer os conselheiros a tomar medidas urgentes para impedir que as quatro maiores firmas de auditoria do mundo – KPMG, Deloitte, PricewaterhouseCoopers (PwC) e Ernst & Young – adquiriram equipes inteiras de auditores de concorrentes menores no Brasil. Eles disseram que a BDO brasileira (antiga aliada da Trevisan) é, hoje, um quarto do que era antes.

Os problemas da BDO tiveram início há pouco menos de um ano, quando quase toda a equipe de auditores da Trevisan foi contratada pela KPMG. A empresa tinha 800 pessoas e hoje está com 200. “É urgente que se tome uma atitude, pois eles (as quatro grandes) estão aumentando a participação como fizeram em outros países”, afirmou Noel Clehane, diretor de assuntos regulatórios da BDO, citando casos semelhantes na Itália, na Inglaterra, na Dinamarca e na Turquia.

“Na França, houve fusões e aquisições e a nossa empresa se tornou 50% menor do que era”, disse David Anderson, advogado do escritório Berwin Leighton Paisner, que defende a BDO no Reino Unido. O caso francês, segundo ele, é um exemplo de como a “guerra das auditorias” pode prejudicar a competição. “Nós perdemos espaço no mercado e mil pessoas lá. Esse movimento pode ser irreversível. Será difícil recuperar mercado no futuro.”

Clehane e Anderson se encontraram com o presidente do Cade, Olavo Chinaglia, no fim de janeiro, para pedir que a KPMG seja obrigada a vender os ativos que adquiriu da Trevisan. Eles querem que o órgão antitruste determine o desfazimento do negócio da KPMG. “Nós temos evidências de que o mercado no Brasil já é concentrado e ficará ainda mais depois da aquisição da KPMG”, afirmou Clehane.

Procurada, a KPMG disse apenas que o processo está tramitando no Cade sob sigilo e que, portanto, não comentará o mérito da questão. A firma enfatizou ainda que tem “plena confiança e respeito às autoridades brasileiras de defesa da concorrência”.

O processo está, hoje, no Ministério da Fazenda, onde a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) realiza uma análise do mercado brasileiro de auditoria que vai ajudar a fundamentar a decisão do Cade.

A BDO quer que o Cade tome uma atitude antes do julgamento final sobre a compra dos auditores da Trevisan, cujo prazo está indefinido. O objetivo seria o de evitar que as auditorias menores percam ainda mais participação no mercado.

Antes da compra dos auditores, a Trevisan era a única firma do setor (fora do grupo das quatro grandes) que conseguia prestar serviços para companhias que faturam mais de R$ 10 bilhões. Depois, a empresa foi limada dessa fatia do mercado, que, no Brasil, atende a 70 grandes companhias.

O Brasil foi o primeiro local em que a BDO reclamou para autoridades antitruste. Em outros países, a empresa, que é a quinta no mundo, questionou as quatro grandes perante autoridades regulatórias. “O Brasil e a China são mercados muito importantes para nós”, afirmou Clehane, lembrando a qualificação do Brasil como a sexta maior economia do mundo.

O caso é considerado inédito no Cade, onde jamais uma firma de auditoria havia reclamado contra aquisições de equipes de pessoal por suas concorrentes. O órgão antitruste entrou em contato com a Office of Fair Trading (OFT) – uma agência britânica que regula a competição – para obter informações a respeito da atuação das “big four” (quatro grandes) naquele país. Fundamentalmente, o Cade quer verificar como as empresas que despontam como quintas colocadas têm equipes adquiridas por uma das quatro grandes no Reino Unido e em outros países.

Os conselheiros também querem responder a pelo menos duas grandes questões antes de decidir. A primeira é se o fato de a BDO ter informado que não encontra uma parceira no Brasil, como a Trevisan, pode ser interpretado como um efeito anticompetitivo no mercado local. Eles querem verificar se não existem condições para uma quinta competidora no Brasil.

A outra questão é que o caso envolve a compra de ativos intangíveis. “Não estamos falando de plantas industriais ou marcas, mas de capital intelectual”, admitiu um conselheiro. “Eu não me lembro de um caso semelhante no Brasil”, completou. Deloitte, PricewaterhouseCoppers e Ernst & Young Terco preferiram não comentar o assunto. (Colaborou Marina Falcão, de São Paulo)

Fonte: Valor Econômico

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