Conselho afasta aplicação do preço de transferência

Por Bárbara Pombo | De São Paulo

A empresa Janssen Cilag Farmacêutica obteve decisão favorável no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) para afastar as regras do preço de transferência em empréstimos feitos à Johnson & Johnson, sua matriz nos Estados Unidos. A maioria dos conselheiros entendeu que os juros recebidos no pagamento não teriam que ser ajustados, uma vez que o Banco Central (BC) tinha controle sobre as operações. Os contratos de câmbio desses empréstimos foram registrados pela companhia.

O entendimento preponderante foi de que o contrato de câmbio equivale ao registro do empréstimo no Banco Central. O preço de transferência é uma forma de a Receita Federal controlar as operações financeiras e comerciais entre empresas situadas em países diferentes para evitar perdas na arrecadação de tributos.

Para advogados, a decisão chega em um momento em que cresce o volume de empréstimos de empresas brasileiras para sua matriz ou filial no exterior. “Com a crise econômica internacional, as multinacionais passaram a realizar essas operações”, diz o jurista e professor de direito tributário da Universidade de São Paulo (USP), Heleno Torres. “Por isso, o tema será muito mais frequente e vai reger a orientação de futuras fiscalizações.” Para ele, a decisão sinaliza ainda a necessidade de aprimoramento das regras do preço de transferência. “Temos uma norma simples e ineficiente para controlar as diversas e complexas operações financeiras, principalmente as de derivativos”, afirma.

No caso da Janssen, a Receita Federal questiona seis de oito empréstimos realizados entre 1999 e 2001, no valor total de US$ 86 milhões. Para a fiscalização, os juros acordados e contabilizados foram inferiores ao limite estabelecido pela lei, o que resultaria em menor recolhimento de Imposto de Renda (IR) e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

A legislação determina um limite de valor para que as empresas brasileiras que realizam operações de mútuo com suas vinculadas no exterior deduzam ou reconheçam como receita os juros pagos ou recebidos. Esse valor é calculado pela taxa Libor (juros de mercado internacional) mais 3%. A regra, estabelecida pelo artigo 22 da Lei nº 9.430, de 1996, não vale, porém, para as operações registradas no BC. Nesse caso, são aceitas as taxas de juros informadas.

No entanto, ainda não é possível registrar no BC o chamado mútuo ativo – empréstimos de empresa no Brasil à vinculada no exterior. Isso é necessário apenas em operações inversas, quando uma companhia empresta dinheiro de sua matriz ou filial. Dessa maneira, os conselheiros da 1ª Câmara da 3ª Turma Ordinária do Carf consideraram que o contrato de câmbio serviria como controle. “Não se pode exigir o que é inexigível”, afirma, na decisão, o conselheiro Marcos Takata, redator do voto vencedor.

Para advogados, o entendimento é relevante porque firma precedente em relação aos limites do artigo 22 da Lei nº 9.430, de 1996. Ou seja, de que as regras do preço de transferência podem ser afastadas nos contratos de mútuo ativo registrados, assim como já acontece nas operações inversas. “Nunca vi decisões nesse sentido. Será possível aplicar o entendimento a diversas empresas”, diz Vivian Casanova, advogada do Barbosa, Müssnich & Aragão Advogados.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que já recorreu da decisão. O caso será julgado agora pela Câmara Superior do Carf, última instância administrativa para discussão de autuações da receita Federal.

De acordo com o tributarista que representa a controlada da Johnson & Johnson no processo, Luis Eduardo Schoueri, do escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri, há outro argumento a favor da empresa. Segundo ele, os empréstimos foram contratados antes de 1996, quando entraram em vigor as regras de ajuste de juros. “O devedor não iria concordar em repactuar o contrato e pagar mais juros só porque a legislação brasileira foi alterada”, diz.

Fonte: Valor Econômico

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