A Receita Federal terá, a partir da próxima segunda-feira, um quadro mais claro sobre como as mudanças contábeis para o padrão internacional afetaram os balanços das companhias que operam no Brasil em 2008. As empresas que optaram pelo Regime Tributário de Transição (RTT) tem até o dia 30 de novembro para entregar o Fcont, declaração que tem o nome completo de Controle Fiscal Contábil de Transição e foi criada em junho deste ano pela Instrução Normativa (IN) 949/09.
O especialista fiscal e tributário Marcelo Simões, da consultoria Aliz Inteligência Sustentável, explica que a declaração vai mostrar para o Fisco qual seria o lucro da companhia antes da mudança contábil. A empresa apresenta o lucro contábil divulgado em 2008 e faz a reconciliação excluindo os itens gerados pela nova lei, mesmo em relação a diferenças temporárias, e adicionando efeitos que existiriam com a norma anterior.
Com esses dados, a Receita saberá com detalhes se o novo padrão contábil aumentou ou diminuiu os lucros das companhias e o que causou essas diferenças. Poderá identificar também se uma mesma mudança contábil gerou efeitos distintos nos lucros de diferentes empresas e, a partir daí, encontrar possíveis desvios. “É um instrumento de monitoramento poderoso, do qual a Receita pode se valer até para fins estatísticos”, afirma Manuel Marinho, sócio da PricewaterhouseCoopers.
Segundo José Luiz R. Carvalho, diretor do Instituto Brasileiro de Auditores Independentes (Ibracon) e sócio da KPMG, a Receita deve usar o Fcont principalmente para acompanhar o que ocorreu no balanço dos principais contribuintes.
Isso se torna particularmente importante quando se observa que uma parte relevante dos balanços mostrou recuperação em relação à crise bem antes da arrecadação federal, que registrou crescimento na comparação anual somente no mês de outubro.
Uma das divergências que poderão ser detectadas pela Receita com o Fcont, mas talvez só em 2010, tem a ver com a apuração do ágio decorrente de uma aquisição e incorporação.
A nova regra contábil deixa claro que o ágio deve ser separado em três partes, sendo uma referente à mais valia de ativos, outra relacionada com ativos intangíveis e uma terceira ligada à expectativa de rentabilidade futura do negócio adquirido. Somente esta última parcela é que fica classificada no balanço como ágio e pode ser amortizada em cinco anos apenas para fins fiscais. Antes disso, a prática mais comum era enquadrar todo o ágio como expectativa de rentabilidade futura, sendo todo ele passível de amortização.
No novo cenário, com a nova lei contábil e o RTT, algumas companhias estão calculando um ágio menor para fins societários e outro “inteiro” para propósitos tributários. O argumento desse grupo de empresas é que o RTT permitiu que elas agissem como fariam até 2007 e essa era a prática corrente até então. A Receita, no entanto, ainda não se posicionou oficialmente sobre como agirá em relação a esses casos, mas há apostas no mercado de que ela fará valer o que já estava previsto desde a criação da possibilidade de amortização de ágio, em 1997, que já falava da separação em três contas. (FT)
Fonte: Valor Econômico