A verdadeira obsessão nacional pelos recordes e primazias encontra na atual sofisticação tecnológica das relações fisco-contribuinte um terreno fértil para se comemorar, mas também refletir. É que entramos na segunda década do Terceiro Milênio vivendo um paradoxo. De um lado, a gigantesca evolução na gestão tributária exercida sobre as empresas, em especial as pequenas e médias. De outro, a administração realizada por empreendedores brasileiros, boa parte estagnada por métodos adotados nos primórdios do século passado.
Em outras palavras, poucos gestores parecem ter percebido que o nosso país é protagonista do maior B2G (business-to-government) do planeta, representado por cerca de meio milhão de emissores de Notas Fiscais Eletrônicas e dois bilhões de operações mercantis já registradas dessa forma, abastecendo as autoridades tributárias com informação confiável e em tempo real. Tudo isso começou em 1991, com a chegada do programa de preenchimento do Imposto de Renda da Pessoa Física, cinco anos depois em ambiente Windows e, desde 1997, com transmissão via internet e sem a opção do formulário em papel a partir da próxima entrega, em abril deste ano.
Já entre as pessoas jurídicas, pode-se resumir décadas de evolução em siglas como Sintegra, Manad e Sped, habilmente orquestradas por um sistema de inteligência não por acaso batizado de Harpia, em alusão à mais poderosa ave de rapina do mundo, pródiga por sua velocidade e visão.
Voltando ao Brasil do presente, um contingente menor ainda de empresas compreende que todo esse universo, composto em geral por indústrias e atacadistas, mantém uma troca de informações, em formato também digital e padronizado, fruto da mesma base de dados daquilo que pode-se considerar o maior B2B (business-to-business) do mundo.
Em suma, o fisco brasileiro levou pouco mais de dez anos para pôr em prática todos os paradigmas do Novo Milênio: conhecimento, tecnologia e comportamento.
Ainda há muito trabalho a ser realizado nessa trajetória, e mesmo assim as autoridades fiscais hoje colhem os frutos de toda essa lavoura, expressos pelos sucessivos indicadores de eficiência na arrecadação. E o que dizer da outra ponta fundamental desse processo, as pequenas e médias empresas?
Ao contrário do fisco, que deu um salto de eficiência à altura da previsão de Peter Drucker sobre a prevalência do “I” sobre o “T” na escalada natural da Tecnologia da Informação (TI), a grande maioria delas limitou-se a substituir antigos processos manuais pelos informatizados. Embora agilizem a produtividade individual, poucos desses avanços correspondem em plenitude à “Revolução da Informação”, igualmente preconizada pelo grande guru da gestão moderna.
Outra constatação intrigante: segundo o Relatório Symantec 2010 sobre Segurança da Informação nas Empresas, 49% das organizações latino-americanas foram alvo de algum tipo de ataque pela rede em 12 meses, e 48% das empresas brasileiras já perderam algum tipo de dado confidencial ou proprietário nos últimos meses em decorrência disso.
Imagine as proporções desse aspecto num contexto em que 100% dos documentos e livros fiscais em breve serão eletrônicos, com todas essas informações trafegando entre contribuintes e fisco, ficando depois armazenadas por pelo menos cinco anos.
Enfim, muito resta a ser feito para que as empresas entrem de fato no Terceiro Milênio, ainda que de forma tardia. Tecnologicamente obsoletas, elas precisam atuar na busca pelo conhecimento e no uso das novas tecnologias. Num cenário assim, cada minuto e centavo investido em capacitação deve ter aplicabilidade imediata, gerando valor ou reduzindo custos.
O grande mérito adicional desse ciclo virtuoso é ser a chave para a inclusão empreendedora de milhões de brasileiros, algo mais do que desejável e oportuno num país que, finalmente, parece ter se encontrado a verdadeira vocação de crescer de maneira sustentada e, consequentemente, duradoura.
Roberto Dias Duarte
Fonte: DCI