Paga mais quem ganha menos

Na avaliação de especialistas, o modelo tributário brasileiro deveria se voltar mais para a renda e o patrimônio, tirando o peso que recai sobre o consumo
 
“A carga tributária está espalhada como uma praga. Tanto afeta a produção (indústria), como o consumo (comércio).” A crítica, do tributarista Erinaldo Dantas Filho, é comum entre seus pares. Na opinião de muitos, o modelo tributário brasileiro peca ao focar mais no consumo do que na renda. “No jargão técnico, nosso sistema tributário é regressivo. Significa que temos uma carga que pesa mais em cima de quem tem menos, porque está quase toda voltada para o consumo e não para a renda”, diz o advogado e mestre em tributação Hugo de Brito Machado Segundo.

Com este modelo, mesmo quem não tem patrimônio nem renda acaba pagando tributos, ao consumir um produto. No supermercado, ao comprar um quilo de feijão e outro de arroz, por exemplo, o consumidor paga 16,54% em tributos embutidos no preço. Na compra de um celular, a tributação representa quase a metade do valor do bem: 41,07%. Num aparelho de DVD, o índice sobe para 51,59%. “Quem ganha um salário mínimo acaba consumindo toda a renda, ou seja, tem sua renda toda tributada. Quem ganha mais consegue aplicar, consegue guardar, e só usa uma parte para consumir. Dessa forma, quem ganha mais consegue pagar proporcionalmente menos tributos”, raciocina.

Em sua opinião, um modelo mais justo necessariamente deveria incidir mais sobre a renda e o patrimônio e menos sobre o consumo. “Essa tributação sobre o patrimônio e a renda poderia ser progressiva. Quem tivesse menos patrimônio e renda pagaria menos (impostos) e assim por diante. Em relação a estes impostos (incidentes sobre a renda e o patrimônio) é possível fazer essa diferenciação. No consumo não”, diz. Ele cita como exemplo de países que adotam este modelo a Finlândia e a Noruega. “Nesses países a carga tributária é maior do que a nossa, mas o “estado social” funciona perfeitamente. Ele fornece transporte público, estradas, hospitais, escolas, tudo de qualidade. O pouco que fica com o contribuinte realmente é para gastar com o que ele quiser”, afirma.

O tributarista também ressalta a importância de um modelo mais simples, que facilitasse o entendimento dos contribuintes. “Além dos impostos que o contribuinte tem que pagar, às vezes ele ainda é multado por erro, porque a legislação é complicada. E são multas pesadas, altíssimas”, observa.

Para Erinaldo Dantas Filho, a própria forma de tributação da renda é equivocada. Ele considera fundamental a diferenciação entre o que é renda e o que é acréscimo patrimonial. Para ele, a tributação deveria ocorrer apenas sobre este último, que é o montante que sobra após o abatimento das despesas do contribuinte. “Tenho que abater do que recebo despesas que são necessárias, como Saúde, Educação e aluguel, por exemplo. Mas no Brasil pago imposto sobre todos os meus proventos. Tenho um abatimento pífio na Educação, em Saúde tenho também mas até por força de medida judicial…”, critica.

Com relação às pessoas jurídicas, ele também faz ressalvas à forma de tributação. “A empresa pode estar faturando muito, mas não quer dizer que está lucrando muito com isso. Isso que é nocivo no sistema tributário brasileiro. As empresas estão pagando muito sobre receitas que não necessariamente indicam renda”, conclui. (Adriana Albuquerque)


Números

45,11% é quanto incide de tributos no refrigerante
16,54% é a carga tributária no arroz e no feijão
18,67% equivalem a tributos no preço final do quilo da carne
19,48% é o percentual tributado no macarrão com relação a seu preço final
41,07% é quanto incide de tributos no preço de um celular
32,81% equivalem a tributos no preço final de um Notebook (acima de R$ 3.000,00)
56,99% é a carga tributária em cima de um microondas
47,06% é o percentual de tributação incidente em uma geladeira
50,60% é quanto incide de tributos no preço final de um I-Pod
51,59% equivalem a tributos no preço final de um DVD
38,75% é o percentual de tributação incidente em um Celta
41,94% é a carga tributária em um veículo Toyota Corolla 2.0

Fonte: Audi Factor

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