Recuperação judicial não justifica ingresso em mercado livre de energia

O fato de o ingresso no mercado livre de energia elétrica ser benéfico para o crescimento econômico de uma empresa em recuperação judicial não autoriza que ela o faça sem cumprir os específicos requisitos definidos pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concluiu que, conforme definido pela entidade, apresentação de certidão negativa de recuperação judicial e falência é exigência que deve ser cumprida para aderir ao mercado livre de energia elétrica.

O julgamento representa uma reafirmação de posição pelo colegiado, que já julgou caso análogo recentemente (REsp 1.990.219). A 4ª Turma, que também julga temas de Direito Privado, ainda não tem precedentes.

Bom para todo mundo…
O mercado livre de energia elétrica é um ambiente de negociação que permite a compra fora da concessionária onde está localizado o consumidor. Por isso, proporciona preço negociado e livre escolha.

Para a Cisam e a Ciafal, fazer parte disso representaria vantagens econômicas. A primeira é siderúrgica e a segunda industrializa e vende artefatos de ferro e aço. Ambas se encontram em recuperação judicial, motivo pelo qual foram vetadas de participar do mercado livre.

Caso tivessem o ingresso permitido, estimam que economizariam R$ 1,2 milhão por ano. O problema é que a apresentação da certidão de recuperação judicial e falência das empresas é uma exigência feita pela CCEE. Com base nesse cenário, as instâncias ordinárias decidiram que seria necessário abrir uma exceção.

Segundo o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, se o objetivo da recuperação judicial é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor e promover a preservação da sociedade empresária, é possível dispensar a apresentação de certidões negativas, de modo a preservar a capacidade da manutenção das atividades.

…Exceto se estiver em recuperação
Essa interpretação foi rejeitada pela 3ª Turma do STJ. Relatora, a ministra Nancy Andrighi identificou que houve aplicação indevida do artigo 52, inciso II da Lei 11.101/2005, segundo o qual as atividades praticadas pelo devedor para atingimento de seus objetivos sociais não podem ser paralisadas ou severamente comprometidas em razão da exigência das certidões ali indicadas.

O objetivo da norma não é diminuir os custos operacionais do devedor, mas dar concretude ao princípio da preservação da empresa previsto na lei nas situações em que a exigência das certidões impeça o devedor de empreender.

“No particular, não se afigura razoável concluir que a impossibilidade de participação das recorridas no Ambiente de Contratação Livre de energia elétrica obstará que elas desenvolvam regularmente suas atividades”, disse a ministra Nancy Andrighi.

Não integrar o mercado livre de energia elétrica não impede as empresas de adquirirem energia para cumprir seus objetivos sociais. Entender diferente violaria, inclusive, o princípio constitucional da liberdade associativa. O Poder Judiciário não pode, como regra, impor aos associados o dever de admitir o ingresso de terceiros que não atendam aos requisitos constantes em seu estatuto.

Por fim, a relatora ainda destacou que, no mercado livre de energia elétrica, o débito gerado por todas as contratações é dividido pelos agentes credores. A partir daí, seus créditos são reduzidos por meio de compensações sistemáticas até serem zerados.

Isso faz com que seja fundamental que os participantes tenham uma saúde financeira estável. A crise de um deles pode elevar os custos econômicos dos demais, que sofrerão as consequências de eventual inadimplemento, mediante rateio dos débitos. Logo, não é recomendável uma empresa em crise financeira e recuperação judicial ingressar nesse ambiente. A votação foi unânime.

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REsp 2.018.286


Fonte: ConJur

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