Laura Ignacio
O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) declarou inconstitucional um dispositivo da Lei nº 10.705, de 2000, que prevê a competência do Estado para cobrar o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre inventários ou doações realizados no exterior. Também estava prevista a tributação sobre partilhas de bens de pessoas que moravam ou possuíam bens fora do país. O Estado vai recorrer da decisão no Supremo Tribunal Federal (STF).
A decisão foi fundamentada em artigo da Constituição Federal. O dispositivo determina que a instituição do ITCMD será regulamentada por lei complementar se o doador tiver domicílio ou residência no exterior; ou se aquele que morreu possuía bens, era residente, ou teve o seu inventário processado no exterior. “Não podia o legislador estadual sobrepor ao federal e regular a matéria, criando variado tratamento tributário entre as unidades Federativas”, disse em seu voto o desembargador Guerriere Rezende, relator do caso. “Os Estados não dispõem de competência tributária para suprir ausência de lei complementar exigida pela Magna Carta.”
No caso, os inventariantes entraram com ação na Justiça contra a cobrança do ITCMD pelo Estado de São Paulo sobre a transmissão de cotas de uma empresa situada no exterior, decorrente da morte de seu proprietário. Na sustentação oral perante o Órgão Especial, o advogado Mário Graziani Prada, do escritório Machado Meyer Advogados, que representou os inventariantes, sustentou que a competência para cobrar o tributo é de lei complementar, que dependeria de maioria no Congresso Nacional para ser aprovada.
Como a legislação complementar não foi editada, os governos estaduais começaram a elaborar suas próprias leis. Elas estabelecem que o ITCMD deve ser recolhido para o Estado onde o beneficiado é residente. Hoje, pelo menos dez Estados, além do Distrito Federal, já têm leis cobrando o imposto. Entre eles, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
“A decisão é importante por ser um precedente de tribunal estadual”, afirma o advogado Rodrigo Brunelli Machado, do escritório Ulhôa Canto, Rezende e Guerra Advogados. “Os tribunais superiores ainda não analisaram o problema.” Para o advogado, a decisão impacta principalmente o planejamento sucessório de pessoas com patrimônio no exterior. Em São Paulo, a alíquota do ITCMD pode chegar a 8%.
Para o advogado Roberto Junqueira de Souza Ribeiro, do escritório Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados, se todos os Estados resolvessem cobrar o imposto, no caso de bem ou falecido no exterior, haveria o risco de bitributação. “Uma lei complementar evitaria o conflito entre Estados”, diz.
Em novembro de 2009, a Fazenda paulista realizou uma mega operação de fiscalização do ITCMD. Pouco tempo depois, no início de 2010, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizou ação direta de inconstitucionalidade (Adin) para questionar a lei paulista.
Segundo o subprocurador-geral tributário-fiscal de São Paulo, Eduardo José Fagundes, o Estado vai recorrer da decisão do TJ-SP. Ele argumenta que o tributo é de natureza estadual. “Assim, na falta de lei complementar, cabe ao Estado legislar”, afirma. “Em relação ao ICMS ocorreu o mesmo porque o imposto consta da Constituição, que é de 1988, mas só em 1996 foi editada a Lei Complementar nº 87, chamada de Lei Kandir, regulamentando a sua cobrança”, disse.
Fonte: Valor Econômico