Pedido de falência em comarca errada impõe deslocamento da recuperação de todo o grupo de empresas

A distribuição do pedido de falência ou recuperação judicial torna o juízo prevento para outros pedidos relativos ao mesmo devedor. No entanto, de quem é a competência para julgar o pedido de recuperação de um grupo de empresas, com sedes em comarcas distintas, se já houve falência requerida contra uma delas, porém em comarca errada?

O conflito analisado pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi instaurado entre o juízo de direito da 2ª Vara de Guaxupé (MG) e os juízos de direito da 1ª Vara Cível de Sertãozinho (SP) e de Guaranésia (MG).

Inicialmente, uma empresa credora ajuizou pedido de falência contra a sociedade Alvorada do Bebedouro S/A – Açúcar e Álcool na comarca de Guaxupé, local da sede da autora. Durante o prazo para contestação, conforme admite o artigo 95 da Lei 11.101/95, a Alvorada e outras quatro empresas do mesmo grupo econômico, em litisconsórcio, apresentaram pedido de recuperação judicial, também no juízo de Guaxupé.

As empresas do grupo Camaq-Alvorada explicaram que estavam requerendo a recuperação naquele juízo porque ali já tramitava o pedido de falência contra uma delas. O artigo 6º, parágrafo 8º, da Lei 11.101 estabelece que “a distribuição do pedido de falência ou de recuperação judicial previne a jurisdição para qualquer outro pedido de recuperação judicial ou de falência, relativo ao mesmo devedor”.

Particularidades

O conflito de competência julgado pela Segunda Seção, conforme análise do ministro Luis Felipe Salomão, autor do voto vencedor, tem particularidades que o diferenciam dos demais conflitos usualmente julgados no STJ. O pedido de falência foi formulado erroneamente perante o juízo do credor (Guaxupé) e havia uma pluralidade de partes (empresas do mesmo grupo econômico) requerendo a recuperação judicial nesse mesmo juízo.

Após deferir o pedido de recuperação judicial, o juízo de Guaxupé acolheu arguição de incompetência apresentada pelo Ministério Público e por um dos credores, reconhecendo que a Alvorada do Bebedouro, ré no pedido de falência, não tinha estabelecimento naquela comarca, mas sim em Guaranésia, onde dirigia a maior parte dos seus negócios. Por isso, declarou-se incompetente e remeteu os processos para Guaranésia.

O juízo de Guaranésia, com base em informações prestadas pelas empresas, concluiu que as principais ações do grupo econômico estariam centralizadas em Sertãozinho, e encaminhou os autos para lá.

Este juízo, contudo, entendeu que cada empresa devedora explorava atividade diversa e de forma autônoma, de maneira que nenhuma tinha predominância sobre a outra. Na opinião do magistrado, todos os juízos das comarcas onde se situavam as sedes das empresas poderiam analisar o pedido de recuperação judicial, pois se trata de competência territorial concorrente. Porém, tendo em vista que atos relevantes do processo já haviam sido decididos pelo juízo de Guaxupé, este deveria processar e julgar a causa.

Volume de negócios

O ministro Luis Felipe Salomão analisou a matéria conforme o artigo 3º da Lei 11.101, segundo o qual a competência para processar a recuperação judicial ou a falência é do juízo do local do principal estabelecimento do devedor. A jurisprudência do STJ, com base ainda na antiga Lei de Falências (Decreto-Lei 7.661/45), fixou o entendimento de que o foro competente para esses casos será o de maior volume de negócios, que é o local mais importante da atividade empresarial.

O ministro destacou que a Alvorada do Bebedouro possui um único estabelecimento em Guaranésia, sendo esta a comarca em que deveria ter sido proposta a ação de falência. Portanto, reconheceu a incompetência da comarca de Guaxupé, onde nenhuma das empresas envolvidas possui estabelecimento.

Salomão afirmou que a competência para julgar a falência é absoluta, e por isso o fato de o juízo de Guaxupé já haver tomado decisões no processo de recuperação não autoriza a aplicação da teoria do fato consumado, pois “o juízo no qual se encontra a ação é absolutamente incompetente para atuar no feito”.

Considerando que o pedido de falência contra a Alvorada deveria ter sido feito em Guaranésia, e tendo em vista o artigo 6º, parágrafo 8º, da Lei 11.101, o ministro concluiu que este também é o foro competente para processar o pedido de recuperação judicial do grupo de empresas.

Assim, segundo Salomão, embora o pedido de recuperação tenha sido efetuado por cinco empresas que compõem um grupo econômico, o fato é que contra uma delas já havia requerimento de falência em curso. “Tudo me faz crer que o juízo competente será aquele em que deveria ter sido proposta a ação de falência”, concluiu.

Ficaram vencidos no julgamento o relator, ministro Raul Araújo, a ministra Isabel Gallotti e o ministro Massami Uyeda.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça

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