Demora da Receita Federal dispensa certidão negativa para recuperação judicial

A demora da Receita Federal para promover atos de quitação de créditos tributários pode afastar a exigência da Certidão Negativa de Débito (CND) para a homologação de um pedido de recuperação judicial.

Com esse entendimento, a Vara Regional de Falências e Recuperações Judiciais e Extrajudiciais de Florianópolis aceitou o plano de recuperação judicial do Figueirense Futebol Clube, sob a condição resolutiva de quitação ou parcelamento de seus créditos tributários federais em até um ano.

Segundo os autos, o clube apresentou o pedido de transação tributária ao Fisco, mas este não se manifestou até a análise do caso pelo juízo. O administrador judicial, por sua vez, sustentou o cumprimento da determinação e pediu a homologação do plano.

Vai e vem de entendimentos

A apresentação da CND pelas empresas que pleiteiam a recuperação judicial é um requisito desde 2005, determinado pelo artigo 57 da Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei 11.101/2005). Porém, ela se mostrou impraticável nos primeiros anos de vigência da norma.

Por isso, juízos e tribunais seguiram entendimento de 2013 da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça que dispensou essa exigência para viabilizar o reerguimento de empresas. Para o relator do caso no colegiado, ministro Luis Felipe Salomão, a obrigação impedia a recuperação judicial, contrariando os interesses das empresas e dos credores — como trabalhadores e a própria Receita Federal.

A jurisprudência dominante mudou em outubro de 2023. Naquele mês, a 3ª Turma do STJ decidiu, por unanimidade, que a apresentação de certidão de regularidade fiscal federal era condição para o deferimento da recuperação judicial.

Na ocasião, o colegiado julgou o recurso especial (REsp 2.053.240) de uma empresa que tentava a aprovação de sua recuperação sem observar as exigências do artigo 57. Na visão do relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, as alterações da legislação promovidas pela Lei 14.112/2020 eram “passíveis de serem implementadas sem ameaçar a existência e a efetividade da recuperação judicial”.

Interesse das partes

Ao analisar os autos do caso do Figueirense, o juiz Luiz Henrique Bonatelli considerou ser necessário dar um prazo adicional para a quitação dos débitos fiscais sem deixar que eles comprometam o plano de recuperação aprovado pela assembleia geral de credores. “Observa-se que mesmo com pedido de transação tributária após o deferimento do processamento da recuperação judicial, em observância aos termos da decisão de deferimento do seu processamento, a ausência de manifestação do Fisco impediria a obtenção da CND ou certidão positiva com efeitos de negativa, para fins de concessão de recuperação judicial.”

O titular do juízo catarinense se baseou em decisão da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo. Ao julgar caso semelhante, o juiz João de Oliveira Rodrigues propôs uma análise sob a óptica econômica do Direito. Ele argumentou, então, que a suspensão do processo de recuperação desconsideraria a “realidade de mercado”, e que permitir o prosseguimento das execuções fiscais poderia destruir o plano aprovado pelos credores.

Rodrigues também apontou que uma determinação de falência por demora da Receita Federal não está prevista na legislação e isso causaria prejuízo às partes. “Como as soluções normativas mencionadas não refletem efetivo benefício econômico aos interessados, conceder prazo razoável à recuperanda para que proceda ao término da transação fiscal, sem comprometer o plano discutido e aprovado, com o imediato pagamento dos créditos, sobretudo os de natureza trabalhista, parece ser o melhor caminho a ser seguido”, concluiu o julgador paulista na ocasião.

Fonte: Conjur.

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