Matéria polêmica divide empregados e empregadores.
Por Gilvânia Banker
Um dos direitos dos empregados resguardado pela Constituição Federal deverá ser regulamentado. O aviso prévio por tempo de serviço é garantido pela legislação, mas a própria Constituição fixa apenas o período mínimo, que é de 30 dias, seja ele trabalhado ou pago pelo empregador. A maioria das empresas, salvo os acordos coletivos de algumas categorias, segue o que manda a legislação. O artigo sétimo, inciso 21, diz que “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo mínimo de trinta dias, nos termos da lei”.
Recentemente, a demora do Legislativo em regulamentar a matéria, levou o Supremo Tribunal Federal (STF) a reabrir a antiga discussão. A corte decidiu, por unanimidade, que é direito legítimo do trabalhador obter o aviso prévio proporcional ao seu período de dedicação à empresa. Porém, os ministros divergiram sobre a quantidade de dias e o julgamento foi suspenso para análise das propostas.
O tema só entrou em pauta em razão das ações de quatro ex-funcionários da Vale que alegaram omissão do Congresso Nacional para legislar sobre o assunto. Apesar de o julgamento ser restrito a estes empregados, o presidente do STF resolveu abrir caminho para o debate. Atualmente encontram-se 49 projetos de lei que tratam do tema no Legislativo, mas todos sem solução.
No STF, o ministro Luiz Fux sugeriu o modelo europeu, que estabelece três meses de aviso prévio para dez anos de serviços ou mais. O ministro Marco Aurélio Mello apresenta a proposta de dez dias por ano trabalhado, respeitando os 30 dias. Já o presidente do STF, ministro César Peluso, defende cinco dias de aviso prévio para cada ano trabalhado, também respeitando o piso.
Mas se depender dos patrões a proporcionalidade do aviso não sairá do papel. De acordo co m o vice-presidente do Sindilojas Porto Alegre, Paulo Roberto Diehl Kruse, dono da Patchwork, os empresários não vão conseguir suportar mais um encargo trabalhista. Segundo ele, a carga tributária já é bastante alta e, se for aliada a mais tempo de aviso prévio, as empresas podem acabar optando pela terceirização em vez da contratação efetiva. Ele lembra que o salário de cada funcionário custa o dobro para as pessoas jurídicas. Ao mesmo tempo, a tributação consome cerca de 30% do lucro das empresas e essa vem sendo a maior reclamação.
Para o vice-presidente da Federasul, o advogado André Jobim de Azevedo, a proporcionalidade, independente da proposta que for aprovada, é preocupante. Ele comenta que esta é uma questão tão técnica que levou o Supremo a cancelar a votação. Azevedo diz que a falta de regulamentação não inviabilizou que algumas categorias buscassem juridicamente os seus direitos ou que definissem a proporcionalidade por dissídio coletivo. Azevedo preocupa-se com a possibilidade que se abre à informalização. Segundo ele, está se fechando a perspectiva de crescimento do emprego no País.
Sindicatos destacam a segurança do trabalhador
As entidades sindicais levantam suas bandeiras pela melhor proposta que trouxer maior segurança aos empregados, além da regulamentação da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que tem como tema a garantia do emprego contra a dispensa não motivada.
Em resumo, ela proíbe a demissão de trabalhadores “a menos que exista para isso uma causa justificada, relacionada com sua capacidade ou seu comportamento, ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço” (Art. 4º). Além disso, deverá ser dada ao trabalhador a possibilidade de defesa das acusações formuladas contra ele.
Para o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT/RS), Celso Woyciechowski a unanimidade entre as entidades é de que seja aprovada aquela proposta mais vantajosa ao empregado. Apesar de algumas categorias já respeitarem a legislação estabelecendo um acordo coletivo, o sindicalista diz que o Brasil precisa evoluir neste sentindo.
Para ele, a Convenção 158 seria um passo social importante. “Tem que haver um motivo para dispensar um funcionário, a fim de evitar as demissões rotativas”, justifica. A opinião é compartilhada pelo presidente da Força Sindical, Luis Carlos Barbosa. Os sindicalistas reforçam a defesa pela regulamentação argumentando os direitos trabalhistas garantidos na Constituição Federal.
Juízes e desembargadores querem a regulamentação
No Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul (TRT/RS) existem diversas opiniões sobre o tema. Mas a posição do desembargador da 3ª Turma do TRT/RS Luiz Alberto de Vargas a proporcionalidade é plenamente legal. Segundo ele, existem diversas propostas e interpretações entre os desembargadores, mas conta que já ocorreram sentenças de até 30 dias por ano trabalhado.
Apesar de favoráveis a proporcionalidade, a interpretação majoritária dos desembargadores e juízes é de que não haja aviso prévio proporcional enquanto não houver uma regulamentação. Conforme Vargas, o STF entendeu que há elementos jurídicos para julgar a matéria.
Empresas calculam os custos da medida
As grandes empresas colocaram as contas na ponta do lápis. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) resolveu fazer um estudo técnico-financeiro com base em algumas propostas. De acordo com dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), a CNC estima os custos salariais adicionais, para o setor produtivo. O levantamento considera o montante de demissões de empregados, sem justa causa, nos anos de 2008, 2009 e 2010, a participação relativa, nessas demissões, de cada faixa de tempo de serviço e a média salarial por atividade econômica.
Desta forma, estimam que, no caso de um mês de salário para cada período de três anos de trabalho, o custo para as instituições seria de R$ 30 bilhões. No cenário de um mês de salário para cada período de cinco anos de atividade, R$ 18 bilhões. Para dez dias de salário para cada ano trabalhado, R$ 29,9 bilhões. Somente no setor do comércio de bens, serviços e turismo, os custos adicionais seriam de R$ 5,2 bilhões a R$ 10,5 bilhões.
Para o primeiro vice-presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e presidente da Federação das CDLs (FCDL), Vitor Augusto Koch, a discussão do assunto é de competência do Legislativo e não do Supremo Tribunal Federal. Ele alega que o Brasil já possui um aparato jurídico que dá segurança ao trabalhador citando o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, Seguro Desemprego, entre outros. O executivo concorda com as opiniões de que, se houver aumento de dias do aviso prévio, corre-se o risco da informalidade. Ele teme, ainda, que o acréscimo na folha de pagamento das micro e pequenas empresas possa levá-las à ruína financeira. A solução, para Koch, é a discussão restrita entre sindicatos e empregadores.
Reforma na Constituição é uma das alternativas para regulamentar a regra
A expectativa é que o Supremo Tribunal Federal retome o debate e que a decisão aconteça ainda neste ano. A advogada trabalhista Regina Guimarães, uma das defensoras dessa ideia, destaca que a matéria é uma forma de atualização do artigo 7º da Constituição.
“É um direito assegurado aos trabalhadores, mas que nunca ficou regulamentado, como vários outros dispositivos da Constituição”, reclama. A advogada diz que “as propostas andaram a passos de tartaruga em várias comissões no Congresso”. Segundo ela, desde 1988, ano da Constituição, tramitam projetos na Câmara tentando regulamentar o tema.
A preocupação da advogada trabalhista é de que haja reconhecimento aos empregados que estão trabalhando há mais tempo nas suas empresas, pois esta seria uma forma de recompensá-los por todo o tempo em que foram úteis às suas instituições.
“Sabemos que os profissionais mais maduros, com pouco mais de idade, enfrentam dificuldades em se colocarem no mercado, e eles precisam se inserir novamente”, argumenta.
Além disso, segundo ela, é uma forma de desestimular as chamadas demissões rotativas, ou seja, quando o profissional alcança um limite de tempo e é demitido.
Fonte: Contadores.cnt.br