A Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira (9), o Projeto de Lei Complementar (PLP) 125/22, que estabelece regras mais rígidas para identificar o devedor contumaz e cria mecanismos para estimular a conformidade tributária de pessoas jurídicas. A proposta, de autoria do Senado, define parâmetros formais para caracterização do devedor sistemático e disciplina programas de cooperação fiscal com a Receita Federal. O texto segue para sanção presidencial.
O projeto atua em duas frentes: combate ao devedor reiterado e incentivo ao cumprimento voluntário por meio dos programas Confia, Sintonia e Operador Econômico Autorizado (OEA). Segundo o relator, deputado Antonio Carlos Rodrigues (PL-SP), o texto preserva a concorrência leal ao diferenciar inadimplência eventual de condutas fraudulentas. “Empresas que utilizam o não pagamento de tributos como uma vantagem competitiva ilícita distorcem o mercado e prejudicam o investimento produtivo”, afirmou.
Regras para identificação do devedor contumaz
O PLP 125/22 define o devedor contumaz como aquele que deixa de pagar tributos de forma reiterada, mediante comportamento direcionado a fugir das obrigações fiscais. Para caracterização, será aberto processo administrativo, no qual o contribuinte poderá apresentar defesa antes da decisão final.
Critérios de dívida substancial
O texto estabelece parâmetros objetivos para definir dívida “substancial”:
1. Tributos federais: dívida total igual ou superior a R$ 15 milhões, correspondente a mais de 100% do patrimônio conhecido da pessoa jurídica.
2. Tributos estaduais e municipais: os entes terão prazo de um ano para definir valores próprios; após esse período, valerão os mesmos parâmetros federais.
Repetição da inadimplência
Será considerado devedor reiterado quem:
1. Deixar de pagar tributos por quatro períodos de apuração consecutivos; ou
2. Deixar de pagar em seis períodos alternados em 12 meses.
A caracterização exige ainda que a inadimplência seja injustificada, sem motivo objetivo que explique a falta de pagamento.
Situações que excluem a caracterização
O contribuinte poderá demonstrar que a inadimplência decorreu de situações justificadas, como:
1. Estado de calamidade reconhecido pelo poder público;
2. Apuração de resultado negativo no exercício corrente e no anterior, salvo indícios de fraude;
3. Ausência de atos para ocultação patrimonial, como distribuição de lucros, pagamento de juros sobre capital próprio, redução de capital ou concessão de empréstimos.
Devedor profissional
O projeto considera “devedor profissional” quem for parte relacionada (controladora ou controlada) de empresa declarada inapta ou encerrada nos últimos cinco anos com dívidas tributárias iguais ou superiores a R$ 15 milhões.
O valor da dívida para enquadramento desconsidera:
1. Dívidas discutidas na Justiça após derrota por voto de desempate no Carf;
2. Créditos tributários de relevância jurídica significativa;
3. Parcelas atrasadas de parcelamentos ou acordos de transação;
4. Débitos suspensos por medida judicial;
5. Parcelas definidas em leis estaduais e municipais.
Processo administrativo e penalidades
Quando indícios apontarem para um possível devedor contumaz, a Fazenda enviará notificação concedendo 30 dias para pagamento da dívida ou apresentação de defesa, com efeito suspensivo. Caso não haja manifestação, o contribuinte será formalmente classificado como contumaz.
Não haverá efeito suspensivo quando houver evidências de que o contribuinte:
1. Foi criado para praticar fraude ou sonegação;
2. Integra organização destinada a não recolher tributos;
3. Utiliza mercadorias roubadas, furtadas, falsificadas, adulteradas ou contrabandeadas.
O processo será encerrado se o contribuinte pagar a dívida integralmente. Se aderir ao parcelamento e mantê-lo em dia, o processo ficará suspenso. O descumprimento deliberado de parcelas poderá reativar a classificação.
O contribuinte deixará de ser considerado contumaz se não acumular novas dívidas enquadradas, se houver pagamento ou demonstração de patrimônio suficiente para cobrir os débitos.
Cadastro de devedores contumazes
O texto determina que a Receita Federal inclua o contribuinte classificado como contumaz em seus cadastros, sem prejuízo do Cadin. Estados e municípios deverão informar à Receita a inclusão e exclusão do contribuinte nessa condição e poderão manter cadastros próprios.
Impedimentos ao devedor contumaz
O contribuinte classificado como devedor contumaz ficará impedido de:
1. Receber benefícios fiscais, incluindo uso de prejuízo fiscal para quitação de tributos;
2. Participar de licitações públicas;
3. Solicitar recuperação judicial.
Além disso:
1. poderá ter CNPJ suspenso;
2. enfrentará processos administrativos com menos instâncias de recurso.
Contratos com a administração pública anteriores à classificação e vinculados a serviços essenciais continuarão válidos.
Programas de cooperação fiscal criados pelo PLP 125/22
O texto institui três programas de adesão voluntária para promover conformidade:
1. Confia – Programa de Conformidade Cooperativa Fiscal
As empresas deverão possuir sistema estruturado de gestão e monitoramento de obrigações tributárias, com documentação sobre políticas fiscais, procedimentos e controles internos.
A adesão dependerá de seleção realizada pela Receita Federal, considerando:
1. Patrimônio, controle acionário, receita bruta e massa salarial;
2. Proporção dos tributos na arrecadação federal;
3. Histórico de conformidade e perfil de litígio;
4. Complexidade operacional.
Plano de trabalho
Ao ingressar no Confia, a empresa deverá cumprir plano pactuado com ações como:
1. Revisão de sistemas e procedimentos internos;
2. Regularização de inconsistências;
3. Formalização de canais de interlocução com a Receita.
A Receita, por sua vez, deverá oferecer:
1. Canal personalizado de comunicação;
2. Renovação da Certidão Negativa de Débitos (CND);
3. Diálogo prévio sobre decisões relativas a compensação, ressarcimento, restituição e reembolsos.
Admissão de débitos
Após adesão, o contribuinte poderá confessar débitos em até 60 dias, pagando apenas juros, sem multa de mora.
Caso apresente plano de pagamento em até 120 dias, a multa também será dispensada.
O pagamento poderá ocorrer com:
1. Entrada de 30%;
2. Saldo em 60 parcelas corrigidas pela Selic.
2. Sintonia – Programa de Estímulo à Conformidade Tributária
A classificação dos contribuintes considerará:
1. Regularidade cadastral;
2. Pagamento pontual;
3. Entrega correta de declarações;
4. Exatidão das informações.
Entre os benefícios previstos estão:
1. Prioridade em pedidos de restituição e ressarcimento;
2. Prioridade no atendimento presencial e virtual;
3. Prioridade em capacitações.
Participantes do Confia terão automaticamente o maior grau de classificação no Sintonia.
Autorregularização
Contribuintes bem classificados poderão autorregularizar parcelas atrasadas, com benefícios como:
1. Redução de até 70% de multas e juros;
2. Prazo de até 60 meses para débitos do INSS;
3. Prazo de até 120 meses para demais tributos.
Poderá ser autorizada a utilização de prejuízo fiscal e base negativa de CSLL para quitar até 30% do saldo devedor após reduções.
3. Operador Econômico Autorizado (OEA)
O programa visa agilizar procedimentos aduaneiros e fortalecer a segurança da cadeia internacional.
Critérios a serem considerados pela Receita incluem:
1. Histórico de cumprimento da legislação;
2. Gestão de registros e controles internos;
3. Solvência financeira;
4. Segurança da cadeia logística;
5. Gestão de riscos.
Facilidades concedidas ao OEA
1. Menor índice de verificação aduaneira;
2. Liberação mais rápida de mercadorias;
3. Prazo ampliado para pagamento de tributos de importação, até o 20º dia do mês seguinte ao registro da DI.
O devedor contumaz não poderá participar do programa.
Bônus para bons pagadores
Participantes do Confia e do Sintonia terão bônus de 1% na CSLL após 12 meses, podendo chegar a 3%, limitado a:
1. R$ 250 mil no primeiro ano;
2. R$ 500 mil no segundo ano;
3. R$ 1 milhão no terceiro ano.
O benefício não se aplica ao Simples Nacional.
Exigências de capital para empresas de combustíveis
O PLP estabelece capital social mínimo para empresas do setor:
1. R$ 1 milhão – revenda de combustíveis líquidos;
2. R$ 10 milhões – distribuidoras;
3. R$ 200 milhões – produtoras.
A ANP poderá ajustar valores conforme particularidades regionais.
Direitos e deveres do contribuinte e da administração tributária
O projeto prevê deveres para a administração tributária, incluindo:
1. Facilitar cumprimento das obrigações;
2. Reprimir fraude e inadimplência;
3. Presumir boa-fé;
4. Considerar capacidade econômica do contribuinte;
5. Adaptar obrigações conforme setores.
Entre os direitos do contribuinte destacam-se:
1. Receber comunicações claras sobre legislação e procedimentos;
2. Acessar e atualizar informações próprias;
3. Ter direito a pelo menos um recurso;
4. Ter processos julgados em prazo razoável;
5. Obter reparação por excesso de exação transitado em julgado.
O PLP 125/22 representa uma reestruturação abrangente na relação entre Fisco e contribuintes, combinando medidas rigorosas contra o devedor contumaz e estímulos à conformidade tributária. O texto cria parâmetros objetivos para identificar inadimplência sistemática, amplia mecanismos de cooperação e institui benefícios para empresas com histórico de cumprimento. A proposta segue agora para sanção presidencial.
Fonte: Contábeis.




