Faltando apenas um voto, Supremo suspende julgamento da emenda 30

Luiza de Carvalho


O ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), será o responsável por dar um ponto final à disputa em relação ao parcelamento de precatórios previsto na Emenda Constitucional nº 30, que já se arrasta há dez anos. A Corte analisa duas ações diretas de inconstitucionalidade (Adins), ajuizadas pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A emenda permitiu o parcelamento de precatórios decorrentes de desapropriações em dez anos, inclusive para os já expedidos na época em que o texto entrou em vigor e para ações ajuizadas até 1999. Ontem, o julgamento foi retomado pela Corte, mas a votação foi suspensa novamente. Já foram proferidos cinco votos favoráveis à concessão de liminar para suspender os efeitos da emenda, quatro contrários e um pela concessão parcial da medida.


A demora no julgamento das Adins fez com que o cenário se complicasse ainda mais. A Emenda 30 foi revogada pela Emenda Constitucional nº 62, do ano passado, que também é alvo de duas Adins no Supremo. O novo texto é questionado pela OAB e por associações de magistrados. As entidades discutem, entre outros pontos, o chamado “leilão inverso”, pelo qual o credor que aceitar receber um valor menor do que aquele devido pelo Estado tem o direito a passar adiante na fila.


A OAB entregou um memorial para os ministros do STF com um pedido para que as quatro Adins fossem julgadas em conjunto, mas, no julgamento, o tema não foi abordado. O ministro Carlos Britto disse que é possível que o mérito de todas as ações seja julgado em conjunto e que pode acontecer das Adins sobre a emenda mais recente serem apreciadas primeiro pela Corte. Isso porque, explica Britto, caso se decida pela inconstitucionalidade da Emenda 62, certamente o julgamento da outra emenda será afetado.


Ao retomar o julgamento, ontem, o ministro Cezar Peluso considerou que, ao impor aos titulares dos precatórios as mudanças na forma de pagamento, a Emenda 30 violou o artigo 100 da Constituição Federal, que determina que a quitação do débito deve ser feito até 31 de dezembro do exercício seguinte, em clara desvantagem para o credor. “A inadimplência sistemática das fazendas públicas não é fruto de uma dificuldade súbita, mas de um profundo descaso administrativo e rotineira prevalência de outros interesses do que pagar suas dívidas”, afirmou. Desta forma, Peluzo acompanhou o voto do ministro aposentado Néri da Silveira, relator original do processo, e do ministro Carlos Britto. Seguiram o mesmo entendimento os ministros Cármen Lúcia e Márco Aurélio. Para a ministra Cármen Lúcia, não se pode permitir que uma decisão judicial seja cumprida somente dez anos depois.


O ministro Ricardo Lewandowski e o ministro Dias Toffoli, que apresentaram ontem os votos em sentido oposto, limitaram-se a dizer que não havia motivos para conceder a liminar, que reverteria processos judiciais após dez anos, trazendo sérios problemas para Estados e municípios. O ministro César Peluso, no entanto, apresentou uma possível solução para este problema. “Quem já recebeu as parcelas não seria atingido, não teria que devolver ao Estado. A decisão afetaria somente os processos pendentes”, disse. Os ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau já haviam votado pela não concessão da liminar.


Na opinião de Flávio Brando, presidente da Comissão de Precatórios da OAB nacional, ainda que os ministros tenham julgado apenas o pedido de liminar feito na Adin, o mérito da ação, na realidade, já foi debatido, ou seja, “pode-se presumir que o resultado será o mesmo”. E esse resultado, segundo Brando, é uma sinalização importante de que a Emenda 62 terá o mesmo destino e seja declarada inconstitucional. “O Supremo não aceitará o calote público”, diz Brando.


O debate, no entanto, foi suspenso com um placar de 5 votos a favor da concessão da liminar, quatro contrários e um voto da ministra Ellen Gracie em um sentido diferente dos demais. A ministra manteve o seu voto de 2004, pelo qual deveria ser suspenso apenas a parte da Emenda 30 que determina a abrangência do novo parcelamento às ações ajuizadas até o dia 31 de dezembro de 1999. Para a ministra, o parcelamento deve atingir apenas os processos já julgados até aquela data, e não os que aguardavam julgamento. O desempate será dado pelo ministro Celso de Mello, licenciado por problemas de saúde. 

Fonte: Valor Econômico

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