Governo altera regras do preço de transferência

Por Laura Ignacio | De São Paulo

Nas operações de importação e exportação envolvendo multinacionais e vinculadas no exterior, o Imposto de Renda (IR) e a CSLL passam a ser calculados de uma nova maneira que tende a ser positiva para os contribuintes. Alterações referentes ao tema estão na Medida Provisória nº 563, publicada ontem pelo governo que, dentre outros pontos, mexe nas regras do preço de transferência.

Apesar de em uma primeira análise a mudança ser positiva, especialistas afirmam que, como a forma de cálculo foi alterada pela norma, há a possibilidade de em algumas situações haver majoração na tributação. A MP, que faz parte do pacote de estímulos anunciado pela União, diminuiu a margem de lucro usada para o cálculo do imposto nas importações de insumos aplicados na industrialização. Passou de 60% para 20%, 30% ou 40%, conforme o setor econômico, o que é positivo para as empresas. Já o cálculo seguiu a interpretação da Receita Federal da Lei nº 9.430, de 1996.

O preço de transferência é uma forma de cálculo do IR e CSLL que estabelece margens de lucro dos insumos ou produtos envolvidos nas operações com coligadas no exterior. O objetivo da regra é evitar que empresas brasileiras façam remessas de lucro para fora do país para recolher menos tributos.

“As mudanças relacionadas ao preço de transferência eram esperadas pelo mercado há anos e tendem a ser positivas”, diz o advogado Alexandre Siciliano Borges, do escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri Advogados. Desde 2010, companhias de vários setores econômicos debatem com o governo federal a elaboração de novos parâmetros para o preço de transferência no Brasil.

A maioria das empresas de grande porte aplica o método de cálculo do preço de transferência chamado de Preço de Revenda menos Lucro (PRL). Antes, por esse método, as empresas que importam bens para revender tinham que aplicar a margem de lucro de 20% sobre o preço do seu produto. Já as que importam para inserir o insumo em um produto a ser industrializado no Brasil aplicavam a margem de 60%. Agora, essa margem passa a ser única nas duas situações.

No geral, esse percentual passa a ser de 20%. Porém, para setores específicos será de 40% ou 30%. Quanto maior a margem, mais imposto a pagar. Para produtos farmacêuticos, fumo, instrumentos óticos e fotográficos, máquinas e aparelhos hospitalares, inclusive odontológicos, bens para a extração de petróleo e gás ou fabricação de derivados do petróleo, a margem de lucro passa a ser de 40%. Bens para a fabricação de produtos químicos, vidro ou feitos com vidro, celulose, papel e metalurgia, a margem passa para 30%.

Segundo a Receita Federal, o objetivo da mudança é modernizar as regras de preço de transferência do país e diminuir as disputas judiciais. “De fato, os contribuintes não poderão mais discutir na Justiça o cálculo do preço de transferência dizendo que a interpretação da Receita não consta da lei”, afirma Borges. Isso porque a MP absorveu o conteúdo da Instrução Normativa nº 243, muito contestada pelas empresas no Judiciário por ser uma interpretação que eleva sua carga tributária.

De acordo com a norma, por opção das empresas, essas alterações já podem ser aplicadas neste ano. Mas se a empresa optar por aplicá-las agora, não poderá mudar de ideia. Por outro lado, a MP diz que o Ministro da Fazenda poderá alterar os percentuais de margem de lucro. “Isso é questionável porque uma mudança só poderia ser feita por lei”, diz a advogada tributarista Mary Elbe Queiroz, do Queiroz Advogados.

Especialistas comemoram o fato de as empresas passarem a ter maior segurança jurídica quanto aos critérios para desqualificação pelo Fisco da margem de lucro usada. Agora, todos estão listados na MP. Além disso, o contribuinte terá 30 dias para apresentar novo cálculo antes de ser autuado. “Isso é importante porque antes a Receita aplicava o método que queria. Muitas discussões na esfera administrativa tratam disso”, afirma a advogada.

A MP também cria um método de cálculo do preço de transferência para a importação de commodities, chamado de PCI, e estabelece um método para a exportação desse tipo de produto, nomeado de PCEX. Segundo a medida provisória, ambos ainda serão regulamentados. Segundo o tributarista Heleno Taveira Torres, a medida é importante porque 70% das exportações brasileiras são de commodities. “A vantagem é que prevalecerá a média do preço diário da cotação em bolsa para o cálculo do preço de transferência, o que dá segurança jurídica às empresas interessadas”, diz. Para ele, de todas as medidas econômicas, essa é a que trará maior impacto tributário para as empresas.

A MP também alterou o cálculo dos juros que incidem sobre os empréstimos de coligadas no exterior. Em 2010, o governo federal estipulou regras de subcapitalização para limitar o valor dos juros (despesa) que pode ser deduzido do IR e CSLL a pagar. Segundo o advogado Fábio Pallaretti Calcini, do escritório Brasil, Salomão e Mathes Advogados, antes os juros cobrados podiam chegar a 3% de spread, mais a taxa libor. “Com a mudança, a libor continua, mas o percentual do spread será definido pela média do mercado. Não ficará mais fixo em 3%”, explica.

Fonte: Valor Econômico

Compartilhar