A Advocacia-Geral da União e o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ajuizaram nesta quinta-feira (3/11) a primeira ação regressiva de trânsito com o intuito de ressarcir os cofres da Previdência Social. Segundo o governo, são gastos R$ 8 bilhões por ano com as despesas decorrentes de acidentes de trânsito. Para diminuir essa cifra, os autores propõem que esse dinheiro seja devolvido aos cofres públicos pelos motoristas infratores causadores de acidentes. Isto é, a ação seria dirigida contra a pessoa física.
Para o advogado Theodoro Vicente Agostinho, sócio do escritório Raeffray Brugioni e membro da Comissão de Seguridade da OAB-SP, a decisão do INSS é um “descalabro judicial”. Agostinho acredita que esse tipo de ação contra pessoa física não tem fundamento legal, inclusive, contraria a definição legislativa de ação regressiva. “Ademais, a previsão que encontramos no artigo 120 da Lei 8.213/91 refere-se à empresa, e não a pessoa fisica.”
O caso protagonista da ação regressiva trata de um acidente que aconteceu no dia 27 de abril de 2008, por volta de 1h30, na Rodovia DF 001, que liga Taguatinga a Brazlândia. De acordo com o processo, o réu conduzia seu veículo de forma incompatível com as condições de tráfego e segurança, havia ingerido bebida alcoólica e seguia pela contramão. Ao manobrar, colidiu frontalmente com o outro veículo, causando a morte de cinco pessoas e lesões corporais em outras três.
Segundo a AGU, com a morte do condutor, que era segurado do INSS, foi gerada uma pensão para a esposa da vítima, além dos dois filhos. O benefício concedido pelo INSS com início de pagamento fixado em 27 de abril de 2008 (data do óbito), com renda mensal atual de R$ 2.133,14. De acordo com dados do Instituto, por conta da pensão por morte gerada pelo acidente, o INSS já despendeu a quantia atualizada de R$ 90.829,91, montante este que, acrescido das prestações pagas e com a respectiva incidência dos juros e correção monetária, deve ser integralmente ressarcido à autarquia previdenciária.
O benefício somente se extinguirá com a morte da pensionista (artigo 77, parágrafo 2º, I, Lei 8.213/91), e tendo em vista a sua idade atual de 37 anos e sua expectativa de vida, de acordo com o IBGE, a pensão continuará a ser paga por aproximadamente 43 anos, o que representa mais 559 prestações mensais, computada a parcela atinente à gratificação anual do 13º salário.
O advogado Vicente Agostinho alerta “que é importante os juízes observarem a legislação. Um precedente favorável ao INSS é extramente perigoso, pois julga o INSS, através de sua procuradoria, ter uma competência que na realidade não tem”.
O ministro da Previdência, Garibaldi Alves Filho, e o presidente do INSS, Mauro Hauschild, foram juntos à Justiça Federal protocolar a ação. Garibaldi disse que, com ações como essa, os motoristas infratores “vão pensar duas vezes antes de dirigir embriagados ou de provocar rachas [corridas] no trânsito”.
Hauschild avisa que outras ações serao levadas à Justiça até o fim do ano, em casos extremos como esse, e, a partir do próximo ano, haverá um volume maior de pedidos de ressarcimento. Mas ele assegurou que a intenção da Previdência Social “não é de fazer uma caça às bruxas, procurando todos os casos de mortes, só os casos mais graves”.
E complementou: “Trata-se de um alerta para quem gosta de dirigir em alta velocidade, pela contramão, em vias de tráfego rápido ou sob efeito de bebidas alcóolicas. Todos devem parar 15 segundos para pensar antes de sair de casa para beber e, então, deixar o carro na garagem e pegar um táxi. Não é justo que a sociedade arque com prejuízos decorrentes desse tipo de comportamento.”
O presidente do INSS afirma que a maioria dos acidentes, no entanto, não tem a mesma natureza dos casos que vão ser ajuizados. A Previdência não pretende acionar herdeiros ou tirar o direito previdenciário de motoristas que sofreram autolesão em acidentes de trânsito, adiantou. “Não seria justo também punir familiares dos motoristas faltosos”, disse Hauschild.
O procurador-geral do INSS, Alessandro Stefanatto, explicou que, com as ações, a Previdência vai tentar receber o máximo possível das despesas financeiras geradas pelos acidentes graves, mas dentro da capacidade financeira do infrator. O motorista poderá ter bens penhorados e, se estiver desempregado, poderá ter que arcar com os prejuízos quando voltar a exercer atividade remunerada. A escolha dos casos será feita pela procuradoria com informações da Polícia Rodoviária Federal, do Ministério Público e da administradora do seguro obrigatório para automóveis, o DPVAT.
Mauro Hauschild lembrou que idêntica medida de tentativa de ressarcimento, por meio de ações na Justiça, está em andamento em relação às empresas responsáveis por acidentes de trabalho. Esses casos também geram aposentadorias extemporâneas e pensões por morte porque algumas empresas não oferecerem segurança adequada aos trabalhadores. Nesse sentido, a Previdência quer receber na Justiça mais de R$ 336 milhões, gastos desde 2007 com o pagamento de aposentadorias e pensões decorrentes de acidentes de trabalho.
Fonte: Conjur