Um advogado de Minas Gerais conseguiu o reconhecimento, pela Justiça do Trabalho, de que a relação que mantinha com um escritório de advocacia não era de sociedade ou prestação de serviços, e sim de emprego. A empresa tentou reverter a condenação a registrar o contrato de trabalho em carteira e pagar as verbas trabalhistas daí decorrentes, mas a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento ao agravo pelo qual buscava trazer o caso à discussão no TST.
O advogado afirmou ter sido contratado como estagiário em 1996, quando cursava o quinto período do curso de Direito. Em 1999, depois de concluir o curso e obter a carteira definitiva da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), foi transferido para a filial do escritório em Uberlândia. Em janeiro de 2002 voltou a Belo Horizonte, até se desligar da firma em maio do mesmo ano.
Terceirização
Na reclamação trabalhista, o advogado sustentou que a relação jurídica que manteve com o escritório, “apesar de estar rotulado como ‘autônomo ou prestador de serviços'”, foi a de emprego, regida, portanto, pela CLT. A empresa, “para se furtar com as suas obrigações trabalhistas”, o teria enquadrado como sócio minoritário, “prática muito usual nessa atividade, infelizmente”, afirmou.
Segundo o advogado, “tal terceirização é totalmente ilegal”, conforme o item I da Súmula nº 331 do TST, uma vez que, como integrante do corpo jurídico, trabalhava na atividade fim da empresa. Além disso, alegou que trabalhou de forma ininterrupta para o escritório ao longo de seis anos “sob subordinação direta”, recebendo salários mensais “muitas vezes de forma fixa”.
Para corroborar sua tese, disse que trabalhava nas dependências da empresa, usando recursos e equipamentos fornecidos por ela, cumpria horários e tarefas predeterminadas, comparecia a reuniões e audiências e se reportava inteiramente aos prepostos, em Uberlândia ou em Belo Horizonte, principalmente por e-mail ou telefone. “Essas condições, por óbvio, não são aquelas próprias do prestador de serviços autônomos”, argumentou.
Advogado associado
O escritório confirmou a contratação como estagiário, mas afirmou que, a partir de sua inscrição definitiva na OAB, o advogado passou a integrar seu quadro de associados até se desligar espontaneamente para abrir seu próprio escritório. Para a empresa, o advogado, “maior e capaz, se associou a outros colegas porque quis”, não cabendo falar em fraude.
“A profissão de advogado, por natureza, é autônoma”, afirmou na contestação, alegando que o tomador dos serviços “não contrata o advogado, mas o escritório, e a procuração não credencia um advogado, mas todos os que compõem o quadro, que distribuem e organizam os serviços”. Sobre a remuneração, disse que não se dava sob a forma de salário, mas de “participação percentual ou fixa sobre os honorários que o escritório recebe diretamente do cliente”.
Vínculo
A sentença da 25ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte reconheceu a existência de vínculo de emprego. Para o juiz, não há incompatibilidade entre o exercício da advocacia e a condição de empregado, embora, no tipo de serviço prestado, “basicamente de caráter intelectual”, os elementos que a caracterizam se apresentem “de forma mais sutil”. A subordinação, pressuposto da relação de emprego, “não é de caráter intelectual, econômico sou social, mas sim jurídica”, assinalou.
No caso, o juiz destacou que o advogado não exerceu apenas as atividades próprias de sua profissão, mas também administrava os escritórios – assinava cheques e documentos contábeis, representava o escritório em eventos, selecionava estagiários e advogados para contratação etc. O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) manteve a decisão e negou seguimento a recurso de revista da empresa, motivando a interposição do agravo de instrumento, no qual insistiu na tese de que o advogado compunha a sociedade como sócio, conforme previsto nos artigos 37 e 39 do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB.
Mas o relator, ministro Hugo Scheuermann, negou provimento ao agravo. Segundo ele, o TRT-MG registrou a presença dos elementos caracterizadores da relação empregatícia – pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação. Tais premissas só poderiam ser questionadas mediante o reexame de fatos e provas, procedimento vedado pela Súmula nº 126 do TST.
O relator ressaltou que as decisões supostamente divergentes apresentadas também foram inespecíficas, pois partiam de premissas fáticas diferentes das do caso em questão – o que, segundo ele, “teria sido facilmente detectado se a empresa tivesse o devido zelo processual de estabelecer o conflito analítico de teses.” A decisão foi unânime.
(Carmem Feijó / RA)
Processo: AIRR-54800-55.2004.5.03.025
Fonte: TST – Tribunal Superior do Trabalho