Municípios vão à Justiça contra isenções fiscais

Os municípios decidiram parar de reclamar das desonerações feitas pelo governo federal e partir literalmente para a briga. A Justiça tem sido chamada a intervir contra a queda nas receitas das prefeituras com a diminuição do repasse ao Fundo de Participação dos Municípios. As administrações municipais correm aos tribunais estimuladas por uma decisão dada no ano passado pelo Supremo Tribunal Federal, que proibiu o estado de Santa Catarina de fazer incentivos fiscais com o ICMS porque parte do imposto arrecadado pertence aos municípios.


O Fundo de Participação dos Municípios (FPM) é alimentado pela arrecadação, feita pelo governo federal, do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados, inconstantes devido aos frequentes ajustes nas faixas de isenção de renda de pessoas físicas e à política de desonerações na produção industrial como forma de estímulo à economia.


A iniciativa de brigar contra a redução do repasse do fundo já prolifera no Nordeste, desde que o tributarista e professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo Fernando Scaff começou a defender a ideia em congressos e cursos ministrados a procuradores fazendários. Dezenas de prefeituras já entraram com ações pedindo o ressarcimento de valores não recolhidos por causa de incentivos fiscais. O fundamento foi a decisão em que o STF colocou o princípio federativo acima da liberdade dos entes arrecadantes.


No caso concreto, julgado em junho do ano passado, os ministros consideraram inconstitucional um programa catarinense que permitia aos empresários adiar o pagamento do ICMS, como forma de estimular a atividade econômica durante a crise. Para a corte, o estado só poderia conceder o benefício em relação à parte do imposto que fica efetivamente nos cofres estaduais, ou seja, 75%. Como os 25% restantes são das prefeituras, como prevê o artigo 158, inciso IV, da Constituição Federal, o município de Timbó, que contestou o benefício fiscal, deveria receber sua parte na data normal e não quando o dinheiro chegasse às mãos da Fazenda estadual.


A Procuradoria-Geral de Santa Catarina protestou, dizendo que os municípios só têm direito aos valores quando o ICMS “deixar de existir como tributo e passar a existir como receita pública, ou seja, quando for arrecadado”, mas o Plenário do STF considerou que o fato gerador já havia acontecido, o que criara o direito de o município receber sua parte.


A tese do STF chamou a atenção do tributarista Fernando Scaff, sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff Advogados. Desde fevereiro, ele anuncia uma reação em cadeia decorrente da decisão. Segundo ele, o acórdão abre espaço para ações questionando a desoneração de IPI feita entre janeiro e setembro deste ano pelo governo federal para estimular vendas de automóveis e eletrodomésticos. “Pela interpretação da decisão do STF, os entes federativos menores estão legitimados a buscar o Poder Judiciário para que a União deposite os valores não repassados”, diz. Os incentivos, segundo o advogado, causam “redução da arrecadação de IPI e, assim, redução dos valores repassados pela União ao FPM e ao FPE” e, por isso, “dispõem indevidamente de parcela que não pertence à União”.


Foi o que alegaram os municípios de Satuba e Pariconha, em Alagoas, à Justiça Federal. Ambos conseguiram manter liminares no Tribunal Regional Federal da 5ª Região para suspender os descontos feitos pela União no IR e no IPI, pelo menos em relação à parcela destinada, via FPM, aos reclamantes. Pela Constituição, 48% do que é arrecadado com esses tributos devem ser repassados aos fundos municipal e estadual. A parcela dos municípios é de 22,5% da arrecadação, mais 1% extra em dezembro. A regra está no artigo 159, inciso I, da Constituição Federal. Nos fundos, 84% das verbas vêm do IR e 16% do IPI.


No caso de Satuba, a decisão, publicada em julho, ainda não foi cumprida. O desembargador federal Vladimir Souza Carvalho, relator, já oficiou o juiz da causa no fim de agosto, pedindo informações sobre o porquê da demora da Fazenda Nacional em obedecer.


O descumprimento das ordens pelo Tesouro Nacional é o principal entrave para as ações, segundo o advogado Jonas de Moura Neto, do escritório Moura & Carriço Advogados, que já conseguiu 33 decisões favoráveis na Justiça Federal nordestina, das 64 ações ajuizadas com a tese. “Já pedimos a prisão e o desconto das multas nos vencimentos dos secretários da Receita Federal e do Tesouro Nacional, pela obstrução ao cumprimento das decisões”, protesta.


Das vitórias do advogado sobre a matéria, cinco são de mérito, em primeiro grau. Ele afirma ter outros 80 contratos de defesa judicial prontos para serem firmados com prefeituras, que esperam apenas a primeira liberação de valores pelo fisco federal. Assim que o Tesouro repassar as verbas, as novas ações entrarão na Justiça. Moura Neto conta 243 prefeituras como clientes.


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Por Alessandro Cristo

Fonte: Conjur

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