Apesar das inovações e benefícios trazidos pela Lei nº 12.016, publicada ontem no Diário Oficial da União, advogados estão receosos com a aplicação de alguns dispositivos da nova legislação. A norma que consolida as regras relativas ao uso do mandado de segurança no país restringiu a possibilidade de pedir liminares nesse tipo de ação – instrumento utilizado no Brasil para os casos em que se alega ilegalidade ou abuso de poder. Pela lei, fica vedada a concessão de liminares para situações vinculadas à importação de mercadorias e bens provenientes do exterior. Segundo advogados, essa proibição pode fazer com que as empresas que precisem da liberação urgente de mercadorias apreendidas enfrentem problemas.
Até então, o juiz acionado por meio de um mandado de segurança analisava cada situação para verificar se concederia ou não a liberação das mercadorias apreendidas na alfândega ou na aduana. Com a nova lei, o temor é de que a vedação para a concessão de liminares seja aplicada antes mesmo de se analisar o caso concreto. “Isso pode desencadear grandes prejuízos para empresas que importam produtos perecíveis ou que podem ficar defasados com o tempo, como mercadorias ligadas à tecnologia”, afirma o advogado Yun Ki Lee, do Dantas, Lee, Brock e Camargo Advogados. A concessão de liminares para os casos que não envolvem fraude, mas há alguma divergência de interpretação relacionadas à classificação aduaneira, por exemplo, tem sido usual até agora, de acordo com o advogado. Antes da nova regra, o juiz poderia conceder a liminar para liberar a mercadoria, desde que fosse dada alguma garantia como o depósito do valor envolvido ou uma carta de fiança, por exemplo. Segundo advogados, não se sabe como ficará essa possibilidade de agora em diante. “Espero que os juízes levem em consideração o princípio da razoabilidade para aplicar esse dispositivo com cautela”, afirma Lee.
Essa é a mesma preocupação do advogado Enzo Megozzi, sócio do Nunes, Sawaya, Nusman e Thevenard Advogados. “Espero que haja bom senso para que a impossibilidade de concessão de liminar não seja utilizada indisciminadamente”, afirma. Se isso ocorrer, muitas empresas poderão sofrer grandes danos. Isso porque, como explica, as companhias podem ficar sujeitas à exigências indevidas de autoridades fiscais ou desprotegidas para liberar suas mercadorias em uma eventual greve dos servidores da Receita Federal.
A nova lei também veda a possibilidade de concessão de liminares para a compensação tributária e também para os servidores públicos que discutem matéria salarial em juízo. Nesses casos, no entanto, a proibição era mais esperada, pois há jurisprudência e normas isoladas que caminham nesse sentido. A impossibilidade de compensação tributária antes do trânsito em julgado da ação – quando não cabe mais recurso – já está prevista no artigo 170 A do Código Tributário Nacional (CTN). Isso evita, na prática, que empresas utilizem esses valores que estão sendo discutidos antes que haja decisão definitiva, o que pode trazer prejuízos à União, caso tenha que reaver esses valores posteriormente em uma eventual vitória posterior. Como já era difícil obter liminares nessas situações, o dispositivo expresso na nova lei não traz grandes impactos para o contribuinte, na avaliação de Megozzi. Na avaliação do advogado Mario Gelli, do Barbosa, Müssnich e Aragão, no entanto, a vedação de liminar para as duas situações é bem complicada. “Isso limita o acesso à Justiça, garantido pela constituição”, diz.
As vedações teriam seus motivos, na opinião do advogado Arnoldo Wald, sócio do Wald e Associados Advogados, que atuou ativamente na elaboração do projeto de lei encaminhado pelo Poder Executivo. ” Essas restrições se explicam por razões de ordem pública, já que a concessão de liminares nesses casos seriam praticamente irreversíveis. Por isso, essas questões só podem ser definidas com decisão final”.
Fonte: Valor Econômico