Propostas de Emenda à Constituição estabelecem partilha de imposto

Por Raquel Ulhôa | De Brasília

Sem perspectiva de uma reforma tributária ampla, Estados consumidores querem garantir, por meio de uma Emenda à Constituição, uma fatia do ICMS sobre as vendas pela internet, o chamado “e-commerce”.

Eles alegam prejuízo com o crescimento do comércio eletrônico – em detrimento do convencional – porque a Constituição estabelece que na venda de produtos e serviços para consumidor final localizado em outro Estado não contribuinte do ICMS (caso da pessoa física que adquire produtos pela rede), o imposto fica no Estado de origem – onde estão as lojas. O resultado é a concentração da receita na região Sudeste. Na tentativa de estancar a perda de arrecadação de Estados consumidores, senadores apresentam propostas para repartir entre a unidade federada de origem e a do destino o ICMS sobre vendas eletrônicas.

“Todos querem que essa situação seja alterada, menos São Paulo e Rio de Janeiro”, afirma o senador Delcídio Amaral (PT-MS), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e autor da proposta mais recente nesse sentido. Ele afirma que o Mato Grosso do Sul, seu Estado, está perdendo em 2011, com o “e-commerce”, cerca de R$ 70 milhões.

Segundo sua Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que tem respaldo da área econômica do governo, quando a operação interestadual ocorrer de forma não presencial, caberá ao Estado do comprador “parte do imposto, a ser definida por resolução do Senado Federal, de iniciativa do presidente da República ou de um terço dos senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros”.

Enquanto essa resolução não for aprovada, Delcídio sugere uma partilha provisória, pela qual o Estado do destinatário fica com 70% do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual.

“O comércio não presencial, mormente denominado comércio eletrônico, cresceu de forma expressiva nos últimos anos e mostra tendência de tornar-se, em futuro breve, a prática preponderante na comercialização de mais e mais produtos”, diz Delcídio, na justificação de sua PEC.

Ele lembra que, em 1988, quando a Constituição foi promulgada, as compras feitas pelo consumidor final de um Estado para outro eram insignificantes. Por isso, a concentração do ICMS na origem não incomodava tanto. “Lá atrás, esse comércio era tímido. O fluxo era pequeno. Só que, à medida que melhoraram as condições para estender esse comércio pela internet, o troço disparou. E os Estados ficaram a pé”, afirma o senador petista.

Em abril, 19 Estados e o Distrito Federal, reunidos no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), assinaram o Protocolo nº 21/11, pelo qual o Estado onde está o consumidor tem direito a parte do ICMS nas operações interestaduais em que a compra é feita por meio de internet, telemarketing ou showroom. Esse protocolo, no entanto, é considerado inconstitucional pelo governo, que, para resolver o problema, sugere alteração na Constituição, como Delcídio está propondo.

O governo não dispõe de dados concretos sobre as perdas, mas estima que o valor seja expressivo para o Nordeste, Norte e Centro-Oeste, cuja população é consumidora de produtos comercializados pela internet, por telemarketing ou showroom.

A Constituição estabelece repartição do ICMS entre o Estado de origem da mercadoria e o de destino apenas quando a operação ocorrer entre contribuintes do imposto. Ou seja, quando o produto for destinado à revenda. Se o destinatário for o consumidor final (caso da pessoa física que adquire produtos pela internet), o imposto devido na operação fica integralmente no Estado de origem.

Outro senador que apresentou PEC sobre o assunto é Luiz Henrique (PMDB-SC), ex-governador de Santa Catarina. Pela sua proposta, a alíquota interestadual também será aplicada quando a operação ocorrer por meio de comércio eletrônico. Ao Estado do destinatário caberá o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual do ICMS.

“Esse modelo de repartição de receitas entre Estado de origem (produtor) e Estado de destino (consumidor), que parecia adequado no cenário de 1988, foi drasticamente modificado pela adoção de novas práticas comerciais, como o chamado comércio eletrônico, por meio da rede internacional de computadores”, diz Luiz Henrique, na justificação da PEC. “A difusão do e-commerce alterou significativamente o balanço comercial entre os Estados, com considerável perda para os Estados consumidores.”

O pemedebista cita, entre as razões do crescimento “vertiginoso” do setor, o fato de a internet não ter fronteiras, ou seja, o consumidor – “mesmo na mais remota cidadezinha do interior do Brasil” – ter acesso a produtos e serviços a preços acessíveis. Cita, ainda, o fato de a compra poder ser feita a qualquer hora do dia ou da noite.

Delcídio se diz uma vítima do aumento das vendas pela internet. Sua família tem loja em shopping de Campo Grande e sofre concorrência da empresa dona da franquia a qual representa, que vende os mesmos produtos pela internet. “Disputamos o mesmo cliente. Muitas vezes ele vai à loja, experimenta, escolhe o modelo e o tamanho e compra pela internet, onde o produto fica mais barato, porque a empresa não tem despesa com aluguel, condomínio, Ecad, funcionários para atender etc. Então é um problema sério.”

Fonte: Valor Econômico

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