O tema da responsabilidade tributária é dos mais relevantes, principalmente quando se trata da ampliação do polo passivo por meio do instituto da responsabilidade solidária. Devido à sua repercussão na cobrança do crédito, a aplicação da regras de responsabilidade solidária usualmente gera divergência entre o Fisco e os contribuintes e responsáveis.
No que se refere às contribuições previdenciárias, é relevante a análise do instituto da responsabilidade solidária por grupo econômico. A Lei nº 8.212, de 1991, em seu artigo 30, IX, prevê que “as empresas que integram grupo econômico de qualquer natureza respondem entre si, solidariamente, pelas obrigações decorrentes desta lei”.
A fiscalização, ao aplicar o dispositivo legal, normalmente também traz como fundamentação o artigo 124 do Código Tributário Nacional (CTN), que prevê a solidariedade entre as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal.
A correta aplicação do instituto, contudo, pressupõe a definição do que se entende por empresas que integram o mesmo grupo econômico, levando-se em conta a diferença da sua ótica jurídica de aplicação nos campos previdenciário e trabalhista.
Para o custeio previdenciário, essa definição encontra-se atualmente regulamentada no artigo 494 da Instrução Normativa RFB nº 971, de 2009, para o qual “caracteriza-se grupo econômico quando duas ou mais empresas estiverem sob a direção, o controle ou a administração de uma delas, compondo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica”, guardando compatibilidade inclusive como o parágrafo 2º do artigo 2º da CLT.
No direito do trabalho, devido a seu caráter mais protecionista, é juridicamente sustentável a configuração de grupo econômico independente do controle jurídico, com base apenas na organização comum da atividade econômica. É o denominado “grupo composto por coordenação” em que as empresas atuam horizontalmente, no mesmo plano, participando todas do mesmo empreendimento (TRT4-RO-19827/97 – DOMG. 22.07.98).
Nesse contexto, a interpretação do conceito de grupo econômico é determinada pelos princípios que direcionam a aplicação das normas do campo trabalhista, que visam dar efetividade aos direitos e garantias dos trabalhadores.
Contudo, quando se trata da aplicação da responsabilidade solidária no campo fiscal, essa linha principiológica protecionista não pode ser aplicada, já que no polo ativo da relação não está o trabalhador e sim o Fisco.
A diferença de enfoque interpretativo é demonstrada, por exemplo, pela correta aplicação do artigo 124 do Código Tributário Nacional. No campo fiscal, o “interesse comum” que fundamenta essa forma de responsabilidade fiscal, deve ser considerado como decorrente do fato de que dois ou mais contribuintes sejam conjuntamente sujeitos da situação fático-jurídica que deu ensejo ao surgimento da relação tributária.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça exarou decisão em embargos de divergência reconhecendo corretamente que o “entendimento prevalente no âmbito das turmas que integram a 1ª Seção é no sentido de que o fato de haver pessoas jurídicas que pertençam ao mesmo grupo econômico, por si só, não enseja a responsabilidade solidária, na forma prevista no artigo 124 do CTN. Ressalte-se que a solidariedade não se presume (artigo 265 do Código Civil de 2002), sobretudo em sede de direito tributário.” (EREsp 834044/RS, Relator ministro Mauro Campell, DJe 29/09/2010)
O fato de que, por exemplo, empresas se apresentem como um grupo empresarial para o mercado, devido a controle ou ligação comum no exterior, por si só não pode caracterizar validamente a hipótese de aplicação de responsabilidade solidária por grupo econômico, devendo haver a comprovação da existência de unidade jurídica de controle ou planificação de atividade de forma que seja interligada a utilização da mão de obra.
Na jurisprudência encontram-se vários precedentes que, com base no artigo 124 do CTN, aplicam a responsabilidade por grupo econômico para empresas que não possuem ligação jurídica de controle ou administração conjunta, unicamente por se apresentarem como sendo integrantes do mesmo grupo empresarial.
Em sentido contrário, citamos precedente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, que aplicando as normas de regência decidiu que “a existência de grupo econômico pressupõe, para além da existência de sócio comum, o controle de uma empresa pela outra ou a administração conjunta de ambas, ou seja, é necessário que haja coordenação dos entes empresariais, fato que não restou demonstrado nos autos.” (AG 2007.04.00.022987-3, D.E. 28/10/2009)
Portanto, entendemos que os artigos 124 do CTN e 31, IX, da Lei nº 8.212, de 1991, somente permitem que a fiscalização busque colocar no polo passivo da obrigação previdenciária empresas que possuem efetivamente vínculo jurídico de controle ou de administração ou que tenham participado conjuntamente da materialidade do fato gerador.
Alessandro Mendes Cardoso é sócio do escritório Rolim, Godoi, Viotti & Leite Campos Advogados
Fonte: Valor Econômico