por Ana Carla de Aguiar Figueirêdo
No dia 18 de Agosto de 2020, foi finalizado pelo Supremo Tribunal Federal o julgamento do Recurso Extraordinário de n° 878313, que por seis votos a quatro, entendeu que é constitucional o pagamento da Contribuição Social prevista no artigo 1° da Lei Complementar 110/2001, em que possibilita o recolhimento de 10% sobre a multa de FGTS em caso de demissão sem justa causa.
A grande maioria dos ministros acompanharam a tese levantada pelo Ministro Alexandre de Moraes, que aduziu ser “constitucional a contribuição social prevista no artigo 1º da Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001, tendo em vista a persistência do objeto para a qual foi instituída”.
Tendo em vista esse entendimento, o Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal negou provimento ao Recurso Extraordinário interposto por uma Empresa de Santa Catarina que pugnava pelo reconhecimento da inconstitucionalidade da referida cobrança da Contribuição Social, considerando que a finalidade para qual foi instituída – recompor financeiramente as perdas das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS decorrentes dos expurgos inflacionários em razão dos planos econômicos denominados “Verão” (1988) e “Collor” (1989) – já foi devidamente exaurida.
Além do mais, relatou também a Empresa Recorrente que os valores advindos da arrecadação da Contribuição Social estão sendo remetidos ao Tesouro Nacional, em razão das contas do FGTS já não serem mais deficitárias, fato que implicaria no desvio de finalidade do recolhimento.
Neste ponto, sustentou que “O desvio de finalidade na aplicação de receita auferida com a contribuição social de 10% sobre o saldo do FGTS do empregado demitido sem justa causa macula a sua motivação original, e transforma a espécie tributária de contribuição, para imposto, em violação também ao artigo 154, inciso I, da Constituição Federal (fl. 16, doc. 14).”
Sobre este fato, ao analisar detalhadamente as questões expostas na peça processual, o Ministro Alexandre de Moraes expôs inicialmente que, de fato, o motivo ensejador para a criação da referida Contribuição foi a necessidade de recomposição das perdas ocorridas em contas do FGTS decorrentes dos expurgos inflacionários advindos dos planos econômicos “Verão” (1988) e “Collor” (1989). No entanto, ressaltou que a sua finalidade não se confunde com os motivos determinantes para a sua criação.
Quanto a finalidade da Contribuição, entendeu o Ministro que esta não se encontra exclusivamente direcionada a recompor as perdas nas contados do FGTS, mas que também foi criada para preservar o direito social dos trabalhadores previsto no art. 7º, III, da Constituição Federal. Por fim, destacou que a finalidade não se comporta em caráter exclusivo, estando a Contribuição instituída no artigo 1° da Lei Complementar 110/2001 vigente por tempo indeterminado, pois não está vinculada a um determinado lapso temporal.
Neste entendimento, os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Gilmar Mendes, acompanharam Alexandre de Morais.
No entanto, apesar do julgamento favorável à União, o Relator do Recurso, o Ministro Marco Aurélio, votou por declarar “a inconstitucionalidade da contribuição social prevista no artigo 1º da Lei Complementar nº 110/2001, a partir de julho de 2012, momento no qual a Caixa Econômica Federal, na condição de gestora e arrecadadora, informou a possibilidade de extinção do tributo, por haver sido alcançado o objetivo que o respaldou.”
A tese levantada para declarar a inconstitucionalidade foi em relação a perda do suporte fático de validade da Contribuição Social, afirmando que os objetivos para a instituição da referida foram claros, e exaurido o escopo desta, se encontra evidenciada automaticamente a perda da legitimação constitucional.
Ademais, o seu voto analisou a informação exposta pela Caixa Econômica, que aduziu através de Ofício a informação quanto ao reequilíbrio das contas do FGTS, ressaltando ainda pela possibilidade de extinção do tributo.
Além do mais, somou-se ainda ao fato da evidência pelo desvio de finalidade, tendo em vista que quando a cobrança chegou a ser extinta pelo Congresso Nacional em 2013 e a presidente à época, Dilma Rousseff, vetou a proposta, afirmando que o adicional não poderia ser extinto pois os seus recursos são usados para o financiamento de programas sociais. Sobre o assunto, ressaltou Marco Aurélio que este fato por si só, demonstra o redirecionamento do tributo, que analisado sob a ótica do figurino constitucional, deve respeitar os contornos da regra matriz de incidência tributária, não podendo, portanto, a figura estatal, se desvincular do desenho imposto pela lei instituidora e pela Carta Maior.
Neste entendimento, os Ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber acompanharam o Relator.
Contudo, cumpre ainda destacar que apesar do entendimento majoritário do Supremo Tribunal Federal ser direcionado à Constitucionalidade da continuidade de cobrança da referida Contribuição Social, fato é que a sua manutenção constata-se como indevida, considerando que atualmente, não encontra-se mais vislumbrada a finalidade principal que ensejou a sua instituição, bem como que, encontra-se evidenciado o nítido desvirtuamento de sua finalidade, não se relevando, portanto, a validade constitucional.
Em face disto, apoiar a presente decisão pela Constitucionalidade da referida cobrança, é o mesmo que contribuir pela insegurança jurídica, tendo em vista que é nítido o exaurimento dos objetivos para qual foi criada a Contribuição Social, bem como a desvirtuação na destinação de seu recolhimento.
Inclusive, ressalta-se ainda ao fato de que a presente Contribuição Social foi extinta pela Lei n° 13.932 de 2019, que em seu art. 12 ressaltou que “A partir de 1º de janeiro de 2020, fica extinta a contribuição social instituída por meio do art. 1º da Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001.” Quanto a este ponto, destaca-se que a presente extinção da mesma, apenas reforça o argumento de exaurimento da finalidade principal para a qual foi criada.
Além do mais, a esse respeito, ressalta-se que inúmeras empresas sofrerão com a presente decisão até o momento da extinção da Contribuição Social, tendo em vista que na condição de empregadoras, arcaram com o recolhimento da multa adicional de 10% (dez por cento) instituída pela Lei Complementar n. 110/2001 até dezembro de 2019, decorrente da rescisão contratual do contrato de trabalho do empregado, quando da demissão sem justa causa e atualmente, com o posicionamento final da Suprema Corte, não poderão exercer de seu direito de restituição e obterem de volta os valores pagos indevidamente.
Portanto, apesar da decisão final do Supremo Tribunal Federal pela Constitucionalidade da cobrança da Contribuição Social instituída pela Lei Complementar n. 110/2001, certo se faz que esta não se configura como o melhor entendimento a ser acolhido, tendo em vista que em consonância com a realidade evidenciada dos fatos, é nítida ainda a cobrança indevida do referido tributo, por este ter tido o exaurimento de seus objetivos iniciais, bem como a desvirtuação na destinação de seu recolhimento, o que vai de encontro com a validade constitucional do recolhimento.