Por Laura Ignacio | De São Paulo
As empresas brasileiras não podem usar o prejuízo fiscal de controladas e coligadas no exterior para diminuir o Imposto de Renda (IR) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) a pagar no Brasil. Assim decidiu a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, contra recurso proposto pela Marcopolo – fabricante de carrocerias de ônibus do Rio Grande do Sul. O leading case foi julgado esta semana pela Corte.
A empresa defendia que, após a entrada em vigor da Medida Provisória (MP) nº 2.158-35, em 2001, a amortização seria possível. Com a publicação da MP, as companhias passaram a ser obrigadas a recolher os dois tributos sobre o lucro auferido pelas empresas no exterior. No processo, a Marcopolo argumentou que se as companhias passaram a ter que pagar tributos sobre o lucro das coligadas, também teriam o direito de descontar o prejuízo das coligadas da base de cálculo do IR e da CSLL. O julgamento era aguardado por várias empresas na mesma situação.
A empresa interpôs o recurso no STJ preventivamente. Não deixou de pagar o IR e a CSLL durante a discussão judicial. O julgamento final, realizado nesta semana, durou só alguns minutos. O ministro relator Mauro Campbell manteve a impossibilidade de uso dos prejuízos computados no exterior, sob pena de haver dupla vantagem do contribuinte, que já utilizaria esse prejuízo no exterior. O ministro Asfor Rocha, que havia pedido vista, acompanhou o voto do relator e foi seguido pelos demais.
A tese defendida pela Marcopolo é a de que se a Receita considera que a empresa estrangeira é um braço da pessoa jurídica nacional em caso de lucro, os prejuízos também devem ser contabilizados no Brasil. Segundo um dos advogados da empresa, Marcos Ideo Moura Matsunaga, do escritório Frignani e Andrade Advogados, o STJ entende que deve ser aplicado o artigo da Lei nº 9.249, de 1995, que proíbe a compensação com prejuízo fiscal de empresa controlada ou coligada no exterior. “Alegamos que tal dispositivo foi revogado tacitamente pela Medida Provisória nº 2.158, de 2001, uma vez que ela trouxe uma nova concepção sobre o tratamento de lucros e resultados de coligadas e controladas”, afirma. A medida provisória determina que o lucro de coligadas e controladas no exterior deve ser tributado no Brasil.
Segundo o procurador da Fazenda Nacional, Marcelo Gentil, que atuou no caso, a vedação ao uso dos prejuízos fiscais não foi revogada como diz a Marcopolo. “A MP não revogou a lei”, diz.
O entendimento da Corte ainda pode mudar, de acordo com o advogado André Pacheco, do departamento jurídico da Marcopolo. Ele afirma que, após publicação da decisão, a empresa estudará se ainda é possível tomar alguma medida no STJ. Porém, diz que um recurso da companhia já tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse recurso, a empresa alega violação ao princípio constitucional da isonomia porque o tratamento dado a lucros e prejuízos das empresas no exterior é diferente. Argumenta também que a proibição do uso dos prejuízos fiscais fere o dispositivo da Constituição Federal que conceitua renda, considerando resultados positivos e negativos. A Instrução Normativa da Receita nº 213, de 2002, que regulamenta a MP, proíbe o uso dos prejuízos fiscais expressamente.
O escritório Mattos Filho Advogados representa empresas em processos judiciais em tramitação, semelhantes ao da Marcopolo. Mas o advogado pondera que a decisão do STJ faz sentido. “Isso porque os prejuízos das empresas no exterior são compensados com os lucros dessas mesmas empresas”, afirma o advogado Antonio Carlos Guzman. “Acho que dificilmente vão conseguir derrubar esse entendimento.”
Hoje, um recurso da Marcopolo será julgado no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Em 2005, o Fisco autuou a empresa em milhões de reais, alegando que a companhia teria deixado de pagar IR e CSLL incidentes sobre lucros retidos nas subsidiárias. O Fisco entendeu que em 1999 e 2000, a companhia gaúcha teria simulado a venda de US$ 55 milhões em mercadorias por meio da Marcopolo International Corporation, sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, e da Ilmot International Corporation, localizada no Uruguai, ambos paraísos fiscais. O objetivo, para a Receita, seria deixar de registrar o lucro dessa venda para economizar tributos.
Fonte: Valor Econômico