Novas armas de combate à sonegação no país

Por Roberto Abdenur

A sonegação fiscal é um dos fatores que mais comprometem o desenvolvimento de uma economia, especialmente quando se trata da economia de um país emergente, como o Brasil. Toda sorte de justificativas é usada pelos sonegadores, desde a alta carga tributária, passando pelos complexos passos para o pagamento dos impostos, até a corrupção entre os responsáveis pelo destino do tributo.

Apesar de total ou parcialmente verdadeiras, na grande maioria dos casos essas justificativas acabam sendo usadas mais como pretextos para uma prática que vem corroendo a saúde da economia nacional: a concorrência desleal. Para enfrentar o problema, vez ou outra, se fazem megaoperações, que têm caráter punitivo e também um significativo efeito midiático.

Em agosto, por exemplo, a Polícia Federal levou a cabo uma dessas iniciativas, com ações coordenadas no Distrito Federal e em 17 Estados. O objetivo era recuperar aos cofres públicos R$ 1 bilhão em impostos desviados.

Essas operações são muito importantes, pois fazem parte do esforço de fiscalização. Mas a prevenção também é fundamental para evitar que haja sonegação de impostos.

Nesse caso, a tecnologia pode ajudar. Principalmente quando proporciona os recursos necessários para o rastreamento de produtos, desde sua produção até a venda ao consumidor. Mecanismos para rastrear e controlar produtos têm sido desenvolvidos em iniciativas de empresas e instituições da sociedade civil que contam com a colaboração da União e de unidades da Federação.

Dois mecanismos têm tido bons resultados: o Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe) e o Sistema de Controle e Rastreamento da Produção de Cigarros (Scorpios). São dois setores da economia muito bem organizados, mas que frequentemente sofrem concorrência desleal por estarem na mira de alguns produtores ansiosos por obter vantagens competitivas pela via da sonegação de impostos.

Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) apontou que mais de 60% das vendas de destilados ocorrem na informalidade. Para mudar essa realidade, em 2008 a União adotou o Sicobe, ferramenta que permite rastrear a bebida produzida no país. O Sicobe envia à Receita Federal, em tempo real e diretamente das fábricas, informações sobre fabricante, marca, data de fabricação do produto, volume, embalagem, etc.

Os resultados são expressivos: um ano após sua implantação, a arrecadação de impostos federais, como IPI, PIS e Cofins, aumentou em 20% no setor de bebidas. O sucesso está levando os Estados a repetir a experiência, para combater a sonegação de tributos como o ICMS.

O desembolso de R$ 0,03 por unidade, a fim de ressarcir a Casa da Moeda pelos procedimentos de manutenção do sistema, provocou reação de alguns pequenos e médios fabricantes. Mas o tempo deve mostrar que vale mais a pena investir na prevenção para enfrentar a concorrência desleal.

O mesmo se dá na indústria de cigarros. Segundo dados da indústria, o comércio ilegal de cigarros (contrabando, falsificação e sonegação de impostos) representa mais de 28% do mercado brasileiro. Estimativas indicam que a perda de arrecadação no setor é superior a R$ 2 bilhões por ano.

O Sistema de Controle e Rastreamento da Produção de Cigarros (Scorpios) é o mecanismo usado pela União para identificar o percurso do produto comercializado, a fim de interromper a cadeia de sonegação. Adotado em 2007, o Scorpios também permite controlar em tempo real o processo de produção e selagem dos cigarros. Fabricados pela Casa da Moeda, os selos contêm informações sobre fabricante, marca, data de fabricação e classe fiscal.

Os Estados já podem contar também com o chamado Business Intelligence – Nota Fiscal Eletrônica (BI-NF-e), que agrega inteligência à análise dos dados gerados pelas notas fiscais eletrônicas, e já em fase de implantação em 16 Estados. O mesmo permite às Secretarias da Fazenda extrair informações para uma melhor fiscalização dos segmentos obrigados à emissão da NF-e, principalmente no controle das operações inter-estaduais.

Além disso, contribui também para aumentar o recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Um recurso para os Estados, que possibilita ampliar a arrecadação sem aumentar a carga tributária.

Na indústria de medicamentos, outro setor bastante afetado pela sonegação e fraudes, os processos de controle são fundamentais para garantir não somente a igualdade concorrencial, mas, principalmente, para evitar riscos à saúde pública, dada a própria natureza do objeto. Em comunicado divulgado em dezembro de 2011, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou que já deliberou sobre as diretrizes que nortearão a implementação do Sistema Nacional de Controle de Medicamentos, conforme determinado pela Lei 11.903/09.

O caminho para o pagamento de tributos deve ser simplificado no Brasil e o destino dos tributos deve ser acompanhado pela sociedade. Independentemente disso, as medidas para prevenir e fiscalizar a arrecadação precisam estar na lista de prioridades de qualquer administrador público.

Com a implementação dos instrumentos citados, todos saem ganhando. O governo, em todas as suas esferas, dispõe de mais recursos para aplicar em melhorias sociais; a iniciativa privada, que passa a ter condições mais equânimes de mercado, e a sociedade em geral, que pode consumir produtos de qualidade testada e aprovada, da sua fabricação até a chegada ao ponto de venda.

Roberto Abdenur é presidente executivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO)

Fonte: Valor Econômico

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