Uma sentença inédita da Justiça paulista afastou uma exigência feita pela Delegacia da Receita Federal para que uma grande empresa de equipamentos de informática se submetesse ao cálculo do Imposto de renda (IR) a recolher denominado Preço de transferência. A empresa, em vez de importar produtos de suas coligadas no exterior, faz a operação por intermédio de uma companhia brasileira – conhecida como interposta – que não tem ligação com as coligadas.
As regras de Preço de transferência existem em vários países – e no Brasil desde 1996 – e são utilizadas pelos governos para evitar que multinacionais transfiram resultados para o exterior “disfarçados” de importações ou exportações entre empresas coligadas, fato que evitaria o pagamento do IR e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) no país onde o lucro foi gerado. No caso da empresa de equipamentos, o juiz federal José Carlos Motta, da 19ª Vara Federal de São Paulo, acolheu seus argumentos por entender que a Instrução Normativa nº 243, de 2002, da Receita Federal, que submete a empresa que adquire os produtos de empresa interposta às regras de Preço de transferência, não está prevista na norma que regulamenta o tema – a Lei nº 9.430, de 1996. Por isso, não caberia submetê-la a essa forma de tributação, segundo a sentença.
Se a decisão for mantida na segunda instância e nos tribunais superiores, a empresa poderá obter uma significativa redução no IR e na CSLL a pagar, segundo seu advogado Bruno Aguiar, do escritório Rayes, Fagundes & Oliveira Ramos Advogados. De acordo com ele, essas operações internacionais em que há aplicação das regras de Preço de transferência têm ganho relevância desde 2006, quando a Receita começou a intensificar a fiscalização. Nesse caso, a empresa se antecipou ao entrar na Justiça, sem que tenha sido autuada anteriormente. O advogado Luiz Felipe Ferraz, do escritório Demarest e Almeida Advogados, também afirma que não haveria como enquadrar essas empresas, já que não há determinação em lei. “Trata-se de um forte argumento formalista”, afirma. Além disso, segundo ele, a utilização da empresa interposta evita que se transfiram resultados para o exterior, o que o uso de Preço de transferência pretende coibir. Essa situação quase foi regulamentada pelo Projeto de Lei nº 4.695, de 2001, que previa uma nova legislação para o Preço de transferência. Entre as modificações estava a inclusão das empresas interpostas em suas regras. O projeto, no entanto, foi arquivado em 2007. “Sem previsão, acredito que a Justiça deva continuar afastando a aplicação do Preço de transferência nesses casos”, afirma Ferraz. Procurada pelo Valor, a Receita não retornou até o fechamento desta edição.
Fonte: Valor Econômico